Dedicado a Dona Militana (São Gonçalo do Amarante-RN)
O negro não aceitou
Existir em cativeiro
E em tudo que pensava
Havia sempre roteiro
De fugir daquela vida
Era seu sonho primeiro.
Nas cidades ou fazendas
Não se davam compaixão
Cavalos valiam mais
Que qualquer negro então
E ainda espalhavam:
“Eles não tem alma não!”
Ferramentas de tortura
Naquela pele escura
Registraram a história
Escrita com amargura
Pintada no corpo negro
A moldura da bravura.
Os tambores que tocavam
Emitiam sons de dor
Que clamavam das senzalas
Um grito que tinha cor
E no batuque noturno
O negro se via senhor!
Pelourinho foi
altar
Que as lágrimas ungiu
Nascidas nas almas
negras
Que as dores exprimiu
E tinha também o tronco
Que a muitos afligiu.
Capataz tinha nas
mãos
Instrumento bacalhau
Chicote de couro cru
Cinco tranças sem igual
Que rasgava pele preta
De forma tão crucial.
O negro para fugir
Sabia o que enfrentava
Se fosse capturado
Seu corpo agonizava
Usando a gargalheira
Coleira que
maltratava.
Os negros trabalhavam
Quinze horas cada dia
Em jornada tão pesada
Pensavam em alforria
E o banzo era
forte
Na vida em agonia.
Naquele tempo surgiu
Redutos de resistência
Quilombos que
acolhiam
Fugidos da dependência
Os que unidos
buscavam
Construir a consciência.
No Brasil colonial
Quilombos em toda parte
Ameaçavam a paz
Vivida nos baluartes
E os homens do poder
Deram mãos ao bacamarte.
Os quilombos existiam
Em diversas regiões
Pernambuco, Alagoas,
Sergipe e extensões
Na Bahia tinham
vários
Lutando contra barões.
Esta luta deu origem
A uma nova profissão
O caçador de escravos
Chamado de Capitão
Que ganhava por cabeça
Devolvida ao “patrão”.
Os escravos que fugiam
Tinham todos a razão
Pois viviam num inferno
Transbordando aflição,
Eram eles as muletas
Do Império sem ação.
E o grito da cor negra
Ecoou pelo Brasil
Lá na serra da Barriga
A “Troia Negra”
surgiu
Eram quase duas mil casas
Com o sangue varonil.
República dos Palmares
Ficou sendo o lugar
Com trinta mil habitantes
Dispostos a pelejar
Liderados por Zumbi
A história faz narrar.
Foi o maior dos quilombos
Que o Brasil conheceu
Nas seis décadas de vida
A liberdade nasceu
Com a luta dos Palmares
Colônia estremeceu.
Mandaram seis mil soldados
Acabar com a nação
Que em terra nordestina
Nos deixou grande lição:
Sem sangue a derramar
Não brota a libertação.
E em vinte de novembro
De um ano destrutível
O Domingos Jorge Velho
Fez um ato desprezível
Degolando Rei Zumbi
O herói inesquecível.
Esse grito foi maior
Atingiu o infinito
Causando grande tumulto
Atiçando o conflito
Já não era mais possível
Negar o que foi escrito.
Outros homens se uniram
Neste grande ideal
Os abolicionistas
De espírito colossal
Que travaram com palavras
A mudança social.
Os nomes vamos lembrar
E também assinalar
Que sem o Joaquim Nabuco
Grande orador sem par
Sem José do Patrocínio
Que imprensa fez usar.
Luiz Gama, Rui Barbosa
Todo mundo a lutar
Foi possível ver o sonho
Então se realizar
Só restando à Princesa
A Lei Áurea assinar
Houve festa na nação
Por tão grande decisão
Estaria o negro livre?
Cantaria uma canção?
Acabou o sofrimento?
Ou foi tudo ilusão?
A escravidão deixou
A semente do racismo
Que nos séculos seguintes
Deu a luz a um abismo
Fazendo acepção
Com a cor do egoísmo.
Fim
Informações catalográficas
Título: A Saga da Liberdade – O grito
da cor negra
Autor: Mané Beradeiro
Data: 27 de janeiro de 2015
Capa: http://napolitica.com/popup.php?/noticias/fotos/img/escravatura.jpg
Métrica: Estrofes em sextilha, com 7 sílabas poéticas
Rima: xaxaxa
Marcadores: História do Brasil, escravidão,
liberdade, miscigenação, quilombos, Zumbi, abolocionismo.
Glossário
Bacalhau: chicote
feito de couro para castigar
Banzo: grande saudade da África
Capitão-de-Mato :
Aquele que vivia nas matas procurando escravos fugitivos
Domingos Jorge Velho: Bandeirante, invadiu e destruiu Palmares em
1692
Gargalheira:
coleira de ferro que eram postas nos escravos capturados
Muletas: “a escravidão era uma das muletas da
monarquia” Austricliano de Carvalho
Pelourinho: Poste
fincado numa praça no qual os escravos apanhavam
Quilombos:
Comunidades de negros ( e índios) que fugiam da escravidão
Tronco:
Instrumento de tortura que prendiam os pés e as mãos dos escravos
Troia Negra: A República dos Palmares, na expressão de
Oliveira Martins.
Zumbi: O maior
líder dos Palmares foi assassinado em 20 de novembro de 1695.
Referências
LUNA, Luiz. O negro na
luta contra a escravidão. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Cátedra de Brasília, 1976.
http://pt.slideshare.net/proffatimafreitas/escravido-africana-no-brasil,
visualida em 25 Jan 2015, às 14 hs
http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=26175.
Visualizada em 27 Jan 2015, às 10:25.