Principia o Carnaval
Quem me dera a cem quilômetros
Da Capital Federal"
BILAC E JOÃO DO RIO
Mas se Artur de Azevedo estava sempre pronto a atacar o Carnaval, outros havia como Bilac e João do Rio que estiveram na primeira fila dos que colaboravam eficientemente pelo esplendor da nossa maior festa popular. Qual a melhor definição de ser carnavalesco do que a de Olavo Bilac publicada numa crônica de "O País" num domingo, 10 de fevereiro de 1907 e depois reproduzida em seu livro "Ironia e Piedade"?
"São uma gente à parte, quase uma raça distinta das outras. Os que amam o carnaval, como amam todas as festas, não são dignos do nome carnavalescos. O carnavalesco é um homem que nasceu para o Carnaval, que vive para o Carnaval, que conta os anos de vida pelos carnavais que tem atravessado, e que, na hora da morte, só tem uma tristeza: a de sair da vida sem gozar os carnavais incontáveis, que ainda se hão de suceder pelos séculos sem fim.
"Que se hão de suceder no Rio de Janeiro, escrevi eu. Porque o verdadeiro, o legítimo, o autêntico, o único tipo de carnavalesco real é o carnavalesco do Rio. A espécie é nossa, unicamente nossa, essencialmente e exclusivamente carioca: só o Rio de Janeiro, com seus carnavais maravilhosos, delirantes e inconfundivéis, possuem o verdadeiro carnavalesco".
É também de Bilac outra crônica que aparece no mencionado livro, constituindo hoje um delicioso flagrante do carnaval de sua época... "Ponham ali na rua do Ouvidor o mais sisudo de todos os homens sisudos, cerquem-no de uma dúzia de moças alegres que o cubram de confete e o inundem a bisnagadas e, se daí a uma hora o sisudo não estiver com a sobrecasaca esfrangalhada e a cartola, amolgada, empenhado com amor e delírio nas mais violentas refregas - então duvidem do poder do carnaval e creiam na fortaleza de ânimo de um Conselheiro Acacio".
Outro fervoroso animador do Carnaval carioca foi João do Rio, o grande cronista desta cidade, tão grande que até hoje nenhum outro conseguiu trazer, para o povo, como ele o fez, o dia-a-dia, os pequeninos e grandes problemas, os sonhos ou as aspirações da cidade, de sua vida. Há páginas de João do Rio que são verdadeiras obras primas como aquela intitulada "Cordões" publicada primeiro na "Gazeta de Notícias" e depois no seu "Alma encantadora das ruas".
ANTOLOGIA DO CARNAVAL
Em 1945, Wilson Louzada organizou uma "Antologia do Carnaval" editada pela gráfica "O Cruzeiro", reunindo páginas de grandes prosadores brasileiros sobre o Carnaval. Se bem que essa antologia não seja completa, e que melhor seria se apresentasse somente os escritores que escreveram sobre o carnaval carioca, eis a relação organizada por W. Louzada:
Manuel Antonio de Almeida - Machado de Assis - Vieira Fazenda - Artur Azevedo - João Ribeiro - Coelho Neto - Olavo Bilac - Graça Aranha - Luiz Edmundo - João do Rio - Lima Barreto - Melo Morais Filho - Mario Sete - Alvaro Moreyra - Carlos Chiacchio - José do Patrocínio Filho - Graciliano Ramos - Aníbal Machado - Ribeiro Couto - Dante Milano - Antonio de Alcantara Machado - Jorge de Lima - José Lins do Rêgo - Adalgisa Neri - Marques Rebelo - Raimundo Magalhães Junior - Francisco Inácio Peixoto - Rivadávia de Souza - Roberto Macedo - Raquel Crotman - Dante Costa - Jorge Amado - Lucio Cardoso - Rubem Braga.
Mas é muito maior a contribuição dos escritores não apenas em páginas de ficção como em estudos, Aníbal Machado, por exemplo - autor de um belíssimo conto intitulado " A morte da porta-estandarte" tem também um ensaio sócio-literário sobre o Carnaval que foi publicado pela extinta "Revista Acadêmica" e irradiada pelo rádio Roquete Pinto.
Além dos escritores arrolados por Wilson Louzada para sua Antologia - que bem merecia uma segunda edição - escreveram em prosa sobre o carnaval: (ordem alfabética) Afonso Arinos - Artur Azevedo - Augusto Frederico Schmidt - Barão do Rio Branco - Carlos Drummond de Andrade - Di Cavalcanti - Elsie Lessa - Gastão Cruls - Gonzaga Duque - Humberto de Campos - José Veríssimo - Lucia Benediti - Mario Pederneiras - Mucio Leão - Murilo Mendes - Orígenes Lessa - Paschoal Carlos Magno - Ribeiro Couto.
Escreveram sobre o Carnaval analisando-o histórica ou sociologicamente: (ordem alfabética) Gilberto Freyre - Melo Morais Filho - Roger Bastide - Roberto Macedo - Tristão da Cunha - Vieira Fazenda e muitos folcloristas: Edison Carneiro - Luiz da Câmara Cascudo - Mariza Lira - Renato de Almeida.
OS POETAS E O CARNAVAL
Escreveram poemas, sonetos, versos livres sobre o carnaval: Alvaro Moreyra - Augusto Frederico Schmidt - Augusto dos Anjos - Ascenço Ferreira - Bastos Tigre - Carlos Drummond de Andrade - Da Costa e Silva - Eduardo Guimarães - Emílio Moura - Epítecto Fontes - Gilka Machado - Guilherme de Almeida - Hermes de Andrade - Manuel Bandeira - Murilo Araújo - Olavo Bilac - Onestaldo de Pennaforte - Oswaldo de Andrade - Oliveira e Silva - Ribeiro Couto e Vinícius de Moraes.
Naturalmente essa relação não é ainda completa, pois o número de nossos prosadores e poetas escrevendo sobre Carnaval, aumenta dia a dia. Carlos Drummond de Andrade - outro exemplo - tem uma série de crônicas ( C. D. A, do "Correio da Manhã" sobre o carnaval da rua Joaquim Nabuco e ano passado Rachel de Queiroz publicou na revista "O Cruzeiro" um delicioso "Caso de Carnaval".
Em muitos romances - Graça Aranha, Gastão Cruls, etc, aparecem capítulos dedicados ao carnaval, assim como há muitos contos, de vários autores descrevendo a festa máxima do povo carioca.
SALVE REI MOMO!
Compreende-se que isso aconteça. Seria impossível aos prosadores e poetas brasileiros, principalmente os cariocas ou os aqui residentes, não participarem da festa do povo, aquele que atinge todas as camadas, a grande festa nivelada das classes sociais e a que dá a todos o direito de cantar alto, de rir, pular e sambar mesmo quando - e isto sempre acontece - contra essa alegria se levantam os grandes inimigos do Carnaval, a polícia, a chuva, os saudosistas.
Pretendo logo depois do aparecimento da "História do Carnaval carioca" publicar uma antologia da poesia carnavalesca e espero que a de Wilson Louzada reapareça em breve aumentada.
É sempre bom sentir que os intelectuais e o povo façam um só todo para saudar Momo, o único soberano que jamais será destronado nesta cidade.
Reportagem de ENEIDA, publicada na Revista Leitura - edição de fevereiro de 1958.