quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

ANUÁRIO DO CORDEL BRASILEIRO (2019)



O primeiro texto do “Anuário do Cordel Brasileiro”  foi escrito de forma
artesanal, usando-se as goivas que abriram sulcos na madeira e deram forma à matriz da xilogravura que ilustra a capa. Um trabalho de Jefferson Campos, nome que está se tornando conhecido no Brasil, nesta arte de fazer a madeira revelar poema.
Ver Lampião sentado, lendo um folheto de cordel é uma imagem muito significativa  e de uma simbologia estética preciosa aos olhos dos leitores e dos poetas.  Zeca Pereira organizou todo o material, Josué G. de Araujo fez a parte da diagramação e a arte final, a Nordestina Editora entrou com o selo na impressão desta antologia que tem 40 poemas, de 28 poetas, oriundos de 8 estados, num volume com 248 páginas.
Atribuí a cada um dos participantes uma nota, avaliando os cordéis.  A escala  vai de 1 a 5. Levei em conta vários tópicos, a saber:
A trama do poema: Prende e surpreende o leitor?
 O Desenvolvimento da narrativa: soube o poeta  escrever o que pensou de forma linear?
Coerência textual: dentro da narrativa apresentada as estrofes estão coesas?
A Rima: o autor fez uso das rimas orais de maneira demasiada? Não repetiu a rima na mesma estrofe?
A métrica: teve o poeta a preocupação de não escrever verso de pé quebrado?
A oração: as estrofes conseguem dentro da sua estrutura funcionarem como uma pequena redação com começo, meio e fim?
Além dos tópicos acima tive o cuidado de observar também a grafia das palavras, a acentuação, pontuação, conjugação dos verbos e outras coisas que quando bem usadas dão beleza ao texto.

Quero chamar a atenção para uma peculiaridade desta antologia, dos 28 participantes 64,2%  possuem curso superior, são graduados nas mais diversas áreas. Esta característica permite-me exigir dos poetas graduados  uma responsabilidade maior no tocante à sua produção textual.  Para eles eu revelo que tive um olhar mais severo.
Tirei alguns exemplos para que tenhamos mais atenção quando formos escrever e evita-los:
 Exemplo 1:
                    Cuia de medir farinha
                    Botija cheia de cana
                   Tem na cozinha uma banca
                    Deixando bela e bacana
                         E o depósito de feijão
                    Pra despesa da semana”

 Lá na frente, o poeta  volta a dizer que tem cuia na casa, desnecessária a repetição.
“Casa de taipa é cultura
Na mobília da cozinha
Tem as cambucas  com sal
Pilão, cuia de farinha
Um ralo de ralar milho
E abanador de palhinha”

Exemplo 2:   
                        “Pelo cipó céu acima
Os meninos foram embora
Subindo de um a um
Cada vez na sua hora
E a velhinha cansada
Dormia feito uma amora” 

Se a palavra amora está sendo empregada no sentido de fruta, como pode ela dormir?

Exemplo 3:
            As estrofes estão obedecendo a estrutura de rima  AAABCCCB, e no meio do texto o autor  resolve deixar uma única estrofe com a estrutura AAABBBBB.
“Se hoje eu fosse contar (A)
Os peixes que tem no mar (A)
Passaria de um milhar (A)
Tem bagre, pargo, corvina (B)
Xareu, parum e cação (C)
Mariquita, atum, dentão (C)
Manjubinha e tubarão (C)
Tudo eu sei ninguém me ensina (B)”

Na sequência ...

“A inveja e a mentira (A)
Não estão na minha lira (A)
O candidato que vira (A)
Não vinga no meu conceito (B)
Votei naquele sujeito (B)
Que não encontrei defeito (B)
Meu cachorro pra prefeito (B)
Fiz, foi feito e está direito (B)”

Exemplo 4:
            Aqui o autor usou  e abusou dos sinais  de pontuação: interrogação (?) e exclamação (!). Fez uma verdadeira sopa.
“Mas verifique o lote
Esse não é pra serrar (!?!)
Pode até tirar os dentes (!)
Nas costas se vai tocar (!?)
Quem trabalha com crianças
Tem que ter mais segurança
Pro acidente evitar (!?!)”

Muitos erros como concordância verbal, pronominal, ortografia, digitação poderiam ter sidos evitados se o conjunto fosse revisado antes da impressão. Coisa a ser pensada pelo Editor, pois no final fica em jogo a imagem do trabalho gráfico da Nordestina Editora.  Vai longe aquele tempo em que os erros de folhetos podiam ser absorvidos sem causar mal estar, e aqui, mais de 50% dos autores são graduados.
Pode ter algum verso de pé quebrado? Sim, é permitido.  Afinal somos falhos e às vezes, por mais que tenhamos cuidado, sempre vai escapar. Vejam o exemplo nesta estrofe:
“A impunidade reina
Por todo o imenso Brasil.
Maracutaias à vista
Comendo feito esmeril.
A oferta de propina
Neste país já é sina
Na politicalha hostil”

Um  único verso desmetrificados dentro de um conjunto com 378 versos. Totalmente admissível.  Agora o que não podemos, como poetas cordelistas, é  achar natural que um texto tenha  192 versos e 79 estejam desmetrificados (41% do poema) . É ora do poeta autor se avaliar se realmente ele é cordelista ou não. E para não dizerem  que estou vendo um cisco no olho do próximo, quando  há no meu  uma trave, já adianto: tive muitos versos desmetrificados. TIVE, mais hoje prezo pela métrica.

Diversos assuntos estão presentes nesse Anuário: fé católica, política, lendas brasileiras, gracejo, romances, sabedoria popular, educação, ecologia, biografia, entre outros.
Criatividade e desenvolvimento  são “roupas” que vestem bem o cordel brasileiro. Para quem o poeta está escrevendo? Qual mensagem ele deseja levar ao leitor com o seu texto?  Ninguém escreve simplesmente por escrever, sempre queremos dizer algo a alguém, nem que seja a nós mesmos.

Abaixo tem a lista com os nomes dos autores, os títulos dos textos e as notas que eu tive a ousadia de dar. O crítico deve ser humano, ético, real.  Não vou nomear os erros encontrados aos seus autores,
    Acursío Esteves – Salvador/BA
1)    Deus, o Diabo e a Saúde Humana – Nota 4
2)   A Grande Ideia – Nota 4
    Antonio Marcos Gomes Monteiro – Itabaiana/PB
1)    Casa de Taipa – Nota 4
AroDinei Gaia de Souza – Cametá/PA
1)    Defensores da Educação no Reino de Já-Temyr – Nota 3
Aurineide Alencar – Catolé do Rocha/PB
1)    A Lenda das Estrelas – Nota  3
Bento Júnior – João Pessoa/PB
1)    A louca da Diocese – Nota 1
2)   O baba ovo – Nota 1
Chico Leite – Morro do Chapéu/BA
1)    O dia em que Rodolfo Cavalcante encontrou a poesia – Nota 4
Cléber Eduão -  Ibotirama/BA
1)    A primeira vez que Zezin Siriema foi a capital visitar um doutor – Nota 3
Flávio Barjes -  Itupiranga/PA
1)    Tonica e o bicho feio – Nota 5
2)   Um deputado perdeu cem mil lá no matagal – Nota 5
Francisco Mendes -  Cametá/PA  e Edna Corrêa – Itapupana/PA
1)    A Borboletinha Branca – Nota 5
2)   A Promessa – Nota 4,5
 Helonis Brandão – Crateús/CE
1)    Tudo eu sei ninguém me ensina ... – Nota 3
Ismael André – Ruy Barbosa/RN
1)    A ferro e fogo: Uma conversa sobre a vida – Nota  4
2)   A História de um José – Nota 3
Ivaldo Batista -  Carpina/PE
1)    Gravidez na adolescência – Nota 3
José Vieira – Manaus/AM
1)    Cantando, pinto sertão com tintas da poesia – Nota 5
2)   Avistamos da estrada no interior do sertão – Nota  4
3)   Sou caboclo, sertanejo, matuto do pé rachado – Nota 4
4)   São essas coisas bonitas que só se vê no sertão – Nota  5
5)   Todo sertanejo chora se não chover no sertão – Nota 5
Josemário dos Santos Fernandes – Ibotirama/BA
1)    O jumento de Zé Nuno – Nota 3
Kalango Menezes – Ibicaraí/BA
1)    As peripécias de Zé Calango em uma palestra no Céu – Nota 3
Luiz Esperantivo – Bom Jesus/PE e Maria Farias – Santa Terezinha/PE
1)    Vida e importância das abelhas – Nota 5
2)   O carnaval no reino animal  - Nota 4
3)   Janeiro Branco – Nota 4
Marcelo Figuerêdo – Bom Jesus da Lapa/BA
1)    Raul Rock Seixas – Nota 5
Márcio Fabiano -  Ribeirão Pires/ ?
1)    Tião Valentão e Rosa Formosa – Nota 4
Marco Binatti – Viamão/SC
1)    O serrote musical – Nota 3
 Nando Poeta – Natal/RN
1)    Reino da corrupção – Nota 5
Pedro Viola – Central/BA
1)    Amor! Virtude que não tem preço – uma história de muitas emoções – Nota 4
Péricles Monteiro- Salvador/BA
1)    A carta de um brasileiro guloso ao Papa Bento XVI – Nota 5
Raimundo Augusto Corado – Santa Rita de Cássia/BA
1)    A mofinez do valentão  - Nota 3
2)   OZé bandeira homem – Nota 4
Ulisses Ângelo – Várzea Nova/BA
1)    A lenda do João de Barro – Nota 4,5
2)   A lenda da Mandioca – Nota 4,5
Vanecílio Paulo – Barcelona/RN
1)    O lamento de um pássaro engaiolado – Nota 4
2)   Nordestino e suas habilidades – Nota 5
     Zeca Pereira -  Barreiras/BA
1)    A confissão de um drogado – Nota 4,5

Concluo a resenha com um verso de uma poeta que não é cordelista,  ei-lo: “Existem coisas que eu digo no meio das coisas que escondo” (Luci Collin).

Mané Beradeiro
04 de dezembro de 2019


segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

RESENHAS DE CORDÉIS NA REVISTA KUKUKAYA Nº 38


Para ter acesso à leitura dos textos  basta clicar aqui: Revista Kukukaia
Nela você vai encontrar  a cultura em suas mais variadas formas.

PEQUENAS AULAS - GRANDES LIÇÕES COM A PROFESSORA CEIÇÃO PAIVA

NOSSA LÍNGUA PORTUGUESA - Tirando dúvidas -
Quando se usa AONDE ou ONDE?
R= AONDE é empregado com verbos que indicam movimento (ir, chegar, levantar...) AONDE vamos?
ONDE é usado para indicar estaticidade: ONDE você mora? ONDE estamos?

AMOR VENCIDO

Há um punhal apontado à garganta feminina.
Uma arma de fogo
Para matar quem ensina.
Não importa qual o nome: Teresa, Isabel, Cristina...

Há um "amor" vencido no coração masculino.
Vestido com ódio insano, um homem com desatino.
Seus atos cruéis, dantescos,
mataram nele o menino.

Não matem e não maltratem quem
nasceu pra dar a luz.

Apontem as suas armas para o alvo do machismo.

Francisco Martins
02 dez 2019