Ter um lar como o que eu tive não tem preço. Meu pai sabia juntamente com a minha mãe manter a paz, o equilíbrio, a alegria. Éramos pobres de bens materiais, mas, imensamente ricos de valores que o dinheiro não compra. Em meu livro "Crônicas Sensoriais" (2009), na página 30 eu digo: E se tinha um momento que nos fazia sentir o quanto éramos unidos, este era a hora do almoço, principalmente quando ao redor da mesa estavam todos os filhos e filhas. Que celebração! que brilho nos olhos de mamãe, que vigor, felicidade e orgulho ostentava papai contemplando sua grei ali, partilhando o pão.
Mamãe (56 anos) e papai (58 anos) |
O último relógio de papai |
Eu sempre tive curiosidade de saber como foi a infância do meu pai. Sabia que foi diferente, criado longe da mãe (Raimunda Doca da Silva) e lá, num passado remoto, que por
sinal ele não gostava de falar, fui buscar peculiaridades que hoje me faz sentir
o quanto ele tinha marcas na alma. .Doca era uma mulher linda, bela em todos os sentidos. Teve um relacionamento quando jovem com um homem chamado Delfino Bento Fernandes, e deste namoro veio ao mundo o meu pai. Doca não pode criar o filho, pois precisou sair de Caraúbas e fugir para Campina Grande, também por razões que desconheço, a criança não foi criada pela família paterna. E aqui, entra o registro narrativo que eu mesmo ouvi de EmídiaLeite, em 31 de março de 1992.
Emídia assegura que no dia 14 de agosto de 1928, portanto, quando papai só tinha seis meses foi entregue por Doca à família de José Leite da Silva, casado com Amélia Leite. Era uma família grande, Zé Leite, o homem que criou meu pai morava na Fazenda João Pereira, distante seis quilômetros de Patu. Naquela casa moravam nove filhos, além do casal. Nazaré Leite dedicou-se aos cuidados de papai, e ele, naturalmente passou a chamá-la de "mainha".Vovô Oliveira (Delfino) |
Se a escola não lhe deu toda a sabedoria necessária, despertou no adolescente o amor, pois lá conheceu uma moça por nome de Nazaré com quem teve seu primeiro namoro. Aos 15 anos viajou pela primeira vez para Campina Grande, onde ficou com sua mãe Raimunda Doca Fernandes.
aos 20 anos |
Quando retornou ao Rio Grande do Norte, já homem feito, conheceu em Janduís -RN aquela que seria sua paixão maior, Raimunda Alves da Costa. Muitos encontros se deram escondidos do pai da moça, e se porventura surgisse algum obstáculo Raimunda encontrava um meio de vê-lo:
" Chiquinho já descobri um meio de nós conversarmos. Após a luz se apagar, venha para o portão do muro. Cuidado! Não erre o portão, a divisa é um pé de cajarana grande". E foi numa noite de Natal, que após a missa em Patu, Chiquinho foi deixar Raimunda em casa.
Aos 27 anos |
Nesta época, Chico Leite, já estava casado e escondeu papai na morada de Açude Novo, acobertado por Epifânio Barbosa, que guarnecia fugitivos da lei. Quando isto aconteceu, meus pais ainda não eram casados.
Eis aí irmãos, netos e bisnetos, uma página sobre a vida do meu pai. Se foi muito cedo, e parafraseando Azevedo eu digo: "cada morte, sejá lá de quem for, é acervo riquíssimo de experiências e sensibilidades que se queima" e do mesmo autor eu cito também: "Família é prato que, quando se acaba, nunca mais se repete".*
Parnamirim-RN, 12 de fevereiro de 2014, 82º aniversário de nascimento de Francisco Fernandes da Silva, meu pai.
*AZEVEDO, Francisco. O arroz de palma. Rio de Janeiro: Record, 2013.
Emocionante, saudades. Parabéns Neto, muito lindo mesmo.
ResponderExcluir"O tempo é algo que brinca com as pessoas..."
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