segunda-feira, 24 de julho de 2023
62 ANOS DO ENCANTAMENTO DE JOSÉ PACHECO DANTAS
José Pacheco Dantas , homem precioso ao seu tempo e patrono da Biblioteca Municipal de Ceará-Mirim, faleceu exatamente há 62 anos, no dia 24 de Julho de 1961.
BIBLIOTECA PACHECO DANTAS E ACLA REALIZAM EXPOSIÇÃO SOBRE AUTORES DE CEARÁ-MIRIM
A Biblioteca Pública Municipal Dr. José Pacheco Dantas e a Academia ceará-mirinense de Letras e Artes - ACLA- Pedro Simões Neto realizam de 31 de julho a 11 de Agosto, uma exposição de livros, onde os autores são naturais de Ceará-Mirim ou escreveram sobre a cidade.
O acervo da exposição cobre todos os gêneros: contos, biografias, ensaios, poesias, crônicas, etc. A abertura vai acontecer dia 31 de Julho, sempre das 8 às 20 h, de segunda a sexta-feira. Nesta primeira etapa que vai até o dia 4 de Agosto, os autores agraciados são:
Adelle de Oliveira
Anete Varela
Armando Holanda
Francisca Lopes (ACLA)
Francisco Martins (ACLA)
Franklin Jorge
Guilherme Luiz Barbosa de Queiroz
Helicarla Morais
Hélio Dantas
Iran Costa (ACLA)
Izulamar Bezerra
Janilson Dias de
Oliveira (ACLA)
Jeane Araújo (ACLA)
Joventina Simões (ACLA)
Júlio Gomes de Sena
Leda Varela (ACLA)
Madalena Antunes
Margareth Pereira (ACLA)
Maria da Conceição Cruz Spineli (ACLA)
Maria das Graças Barbalho B. Teixeira (ACLA)
Maria Heloísa Brandão (ACLA)
Maria Lúcia de Oliveira Brandão
Meira Pires
Mucio Vicente (ACLA)
Nilo Pereira
Pedro Simões (ACLA)
Rodolfo Garcia
Ruy Lima
Vera Lúcia de Lima Barreto
sábado, 15 de julho de 2023
RIMA, MÉTRICA E ORAÇÃO: UMA CONVERSA ESCRITA SOBRE CORDEL
Em tempos remotos, nos primórdios da nossa literatura popular, mesmo que muitos versassem em composições mais simples, como por exemplo, em quadrinhas, percebe-se, quando vamos à literatura da época, que havia um cuidado desmedido com um elemento denominado métrica.
É certo que poderia ser que alguns sequer soubessem o que vinha a ser esse elemento, mas, automaticamente, ele aparecia pela sonoridade. Afinal, a poesia sempre andou em “par e passo” com a música.
Na cantoria, desde os trovadores medievais se percebeu que as frases postas para o recital ou para a cantiga careciam de uma “medida certa”. Quando faltava ou sobrava, isso interferia diretamente no compasso musical ou recitatório. Assim, ao longo dos anos, a poesia popular, as cantigas populares e principalmente a literatura popular em folhetos de cordão, ou para cordão, logo denominados com maior sonoridade de cordel, no mais português dos termos, foi se moldando a esse conjunto de regras, principalmente por se ter a necessidade de cantá-la em obediência a um compasso medido, mesmo que intuitivamente.
A literatura popular em folhetos de cordel é uma espécie de gêmea da cantoria nordestina (ou vice-versa), de forma que muitos cantadores foram ou são literatos dessa vertente, como muitos cordelistas também bebem, beberam ou beberão na fonte da cantoria. E ambas carecem de obediência às regras pré desen volvidas por esse ciclo evolutivo. Sem o rigor dessas regras, a poesia perde em encanto e qualidade, uma vez que em tudo que fazemos precisamos observar o regramento, que é matriz de toda ou qualquer invencionice humana.
Há de se admitir que a tarefa de escandir versos não é algo de fácil compreensão. Eu, por exemplo, por muito tempo não tive consciência desse regramento. Lia folhetos para cordel costumeiramente e absorvi a forma. Era, como é, algo que flui naturalmente na sonoridade. Mas, o mais desatento e desinformado dos leitores, logo percebe ou deixa perceber ao ouvinte, quando lê que algo está errado quando no texto lido há desmetrificação.
Como é desagradável ler poesia popular sem métrica.
Experimentamos dois exemplos rasteiros:
O Brasil está de luto,
O povo passando fome,
O emprego não existe,
A pátria perdeu o nome,
É muito certo o ditado:
Quem não trabalha, não come.
(Marcos Teixeira)
Ao ler essa estrofe setessilábica, o leitor desliza numa sonora lógica, logo cantante, sem empecilhos linguísticos ou dissonância rítmica.
Agora, experimentemos a mesma estrofe com uma desmetrificação proposital:
O Brasil está certamente de luto,
O povo passando fome.
O emprego não existe,
O nosso país perdeu o nome,
É muito certo o ditado,
Quem não trabalha não come.
(Marcos Teixeira).
A leitura ou a cantiga dessa estrofe com o acréscimo de sílabas nos primeiro e quarto versos, são suficientes para emaranhar a tônica dos versos na rítmica do leitor, percebe?
Tornou-se comum haver embate de escritores com pseudos escritores de literatura popular, principalmente da poética do Cordel, quanto a esse assunto. Enquanto alguns somos defensores das métrica e rimas corretamente aplicadas, há outros que, por desconhecerem ou desaperceberem essa gritante diferença, ignoram, desdenham e desusam a mais importante característica da literatura popular…
O cordelista potiguar Marciano Medeiros é um desses observadores contumazes da forma. Seus trabalhos são exemplos da perfeição técnica que reúnem o conjunto perfeito em harmonia: rima, métrica e oração. Esse é o tripé mágico da cantoria, como do cordel. Veja um exemplo na estrofe setessilábica em sextilha, de Marciano Medeiros:
No seu trabalho notório
Essa autêntica figura,
Gostava de poesia
Essa mensagem tão pura,
Escrevendo belos versos
Pra nossa literatura.
(Folheto: Diógenes da Cunha Lima nos trilhos da poesia – Marciano Medeiros)
São seis versos de sete sílabas poéticas compondo uma estrofe biográfica conforme propôs o autor.
Assim como em Marciano, que não é cantador, nos cordéis escritos por cantadores também, costumeiramente, se encontra a fidelidade formal defendida pelas regras dessa modalidade literária.
No caraubense José di Rosa Maria, exímio poeta das letras e da viola, achamos muita qualidade expressada e grafada em suas Obras, mesmo que aqui interesse apenas a forma. Vejamos:
Mesmo assim, meio confusa
Lembrou num certo momento,
De uma amiga que fez
Na sala de ensinamento,
Que residia sozinha
Num simples apartamento.
(Folheto: A Mãe do Filho do Lixo – José di Rosa Maria)
O exemplo acima repete a tônica do primeiro exemplo. Estrofe de seis versos em sete sílabas poéticas, com rimas rigorosamente dentro dos padrões predefinidos e sem repetição.
Parece-me que das minhas leituras habituais de literatura popular, extraio a seguinte observação: diferente da progressão natural de qualquer ciclo evolutivo, com o cordel ocorre uma espécie de contralógica, de tal forma que é nos trabalhos mais antigos onde encontramos maior fidelidade a essas regras.
Citaria muitos dos cordelistas contemporâneos e vários dos séculos XIX e XX, desde os notoriamente conhecidos, como Leandro Gomes de Barros e Manoel D’Almeida Filho em uma época, Patativa do Assaré e Antônio Teixeira em outra e Francisco Gabriel Ribeiro e Nando Poeta em dias atuais, todos como zelosos metrificadores em três momentos distintos desta literatura.
Os livretos de literatura popular em folhetos de cordel, ou mesmo essa modalidade literária impressa em livros, como é o exemplo de autores contemporâneos como Antônio Francisco e Marcos Teixeira, com os livros Dez Cordéis num Cordel Só e Uma Corda de Cordéis, respectivamente, a poesia ou o poema pode aparecer em forma diversa da sextilha, sendo comuns a décima setessilábica e a décima decassilábica, vindo essas modalidades certamente da Cantoria nordestina de viola.
Merecendo destaque em ambas as variações, o olhar atento dos escritores para a forma e a obediência às métrica, rima e oração.
Assim como citamos bons exemplos de observância à norma, é possível citar inúmeros autores que a ignoram. Outros que até desdenham quando são confrontados ou simplesmente advertidos quanto ao tema.
Fato é que, com o advento da democratização da arte gráfica pela expansão da informática e dos computadores, perdeu-se o controle editorial de certos impressos. O folheto de cordel talvez seja o que mais sofreu essa mudança. Hoje, é bem possível um autor escrever, compilar e ele mesmo editar e publicar um trabalho. Assim, não raros são os exemplos de inobservância da norma, desde gramática e ortografia, até rima, métrica e oração, no caso do cordel.
Posiciono-me na defesa de uma linha editorial. Principalmente nas Academias e organizações formais, pois assim, necessariamente, antes da publicação o material deverá ser submetido à revisão ortográfica e, principalmente, formal. Assim, evitando-se deficiências várias de múltiplos pontos de vista.
A temática pode ser “modernista”, mas essa pretensa escola literária tem que ser trabalhada pela ótica de suas regras. Não deve ser feita unicamente pela vontade do escritor, mas necessariamente pela absorção das técnicas, como ocorre com toda ou qualquer arte.
Tenho me deparado com coisas que me assustam, sendo repassadas como cordel. Textos esdrúxulos do ponto de vista estético e ortográfico, com rimas apenas fonéticas e às vezes “monotônicas”.
É comum que os observadores das regras se sintam retraídos em observar algo dissonante no trabalho de algum colega, mas isso não deve existir. Observador e observado devem fazer do momento da observação um exercício de aperfeiçoamento da técnica e solidarizarem-se numa troca profícua de saberes para maior valorização crítica do que se produz.
Sabemos da importância da mensagem, do passar a mensagem, mas entendemos que sem essa busca pela técnica não nos firmaremos tão cedo enquanto escola literária e, ainda, não conseguiremos ocupar espaço nas searas didática, acadêmica e editorial.
BIBLIOGRFIA
MOTA, Leonardo. Poesia e Linguagem no Sertão Cearense. A. J. de Castilho, Rio, 1921.
MEDEIROS, Marciano. Diógenes da Cunha Lima nos Trilhos da Poesia. Serra de São Bento, 2010.
ROSA MARIA, José di. O. A Mãe do filho do Lixo. Fundação Ving Tun Rosado. Mossoró. 2010.
Marcos Teixeira é poeta repentista, cordelista e escritor. Membro da Academia Norte-rio-grandense de Literatura de Cordel e da Comissão Norte-rio-grandense de Folclore. Autor de Uma Corda de Cordéis, O Dueto Ética e Moral à Luz da Filosofia, A Bomba da Salvação, O Julgamento do Machado, A Janela e outros...
Texto copiado de https://foque.com.br/rima-metrica-e-oracao-uma-conversa-escrita-sobre-cordel/
COMITIVA DO IHGRN REVISITA A VIAGEM DE LEÃO VELOSO DE 1861
1861. A província do Rio Grande do Norte andava a cavalo e a burro e, saindo pelo rio Potengi, em Natal, a navegação de cabotagem ligava as pontas do Rio Grande pelo litoral e daqui para fora pelos competentes serviços da companhia de navegação pernambucana.
Em 1861, a Comitiva do presidente da Província Leão
Veloso saiu para uma viagem de 44 dias pelo sertão do Rio Grande do Norte.
Foram e voltaram de navio e percorreram o sertão a cavalo. Agora, em 2023,
Honório de Medeiros, André Felipe Pignataro e Gustavo Sobral pretendem refazer
o itinerário em uma Comitiva do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande
do Norte.
Honório
de Medeiros é professor de Filosofia do Direito e
Direito Constitucional, ensaísta, escritor, autor de Poder Político e Direito,
Massilon e História de Cangaceiros e Coronéis.
André
Felipe Pignataro Furtado de Mendonça e Menezes
é advogado e pesquisador, diretor de pesquisa do IHGRN.
Gustavo
Sobral é jornalista e escritor, tudo que escreve e publica
está no site pessoal gustavosobral.com.br.
domingo, 2 de julho de 2023
TORPEDO DE MANÉ BERADEIRO 050/2023
Grande semelhança com a citação abaixo:
1 Coríntios 15:33
"Não se enganem: As más companhias corrompem os bons costumes.”
sexta-feira, 23 de junho de 2023
A CONVERSA QUE EU NÃO TIVE COM A POETA NÍSIA BEZERRA DE MEDEIROS
FRANCISCO MARTINS: QUAL FOI A SUA EXPERIÊNCIA COM A DOR?
NÍSIA BEZERRA: Toquei a dor com as mãos, e senti medo. Ah! se você soubesse! o sabor de sangue, o gosto de dor que eu sinto no peito. Sou feita de dor, doendo, na minha dor meio amarga, eu sinto o mundo, estrangeiro.
NB: Sou terra seca, terra molhada, húmus de terra. Eu nunca fui poeta, nem asceta. Sempre fui peregrino.
Nota: Conforme anuncio no título, essa conversa nunca foi real. Perguntas e respostas foram montadas a partir da leitura que eu fiz do livro "Grito Interdito", Natal-RN, 2022.
PRIMEIRA SEMANA DE JULHO TEM A EDIÇÃO Nº 75 DA REVISTA DA ANRL
Na primeira semana de Julho sai a edição 75 da revista mais esperada do Rio Grande do Norte. Lê-la é se alimentar do que há de bom na literatura potiguar. Sou leitor e colecionador deste periódico trimestral, que tem o olhar laboral de Manoel Onofre Jr, Diretor e Thiago Gonzaga, Editor. A capa do número 75 é de Zaíra Caldas.
quinta-feira, 22 de junho de 2023
DA VEZ QUE MILTON SIQUEIRA ESCREVEU COMO POETA MATUTO
O Poeta Milton Siqueira (1911-1988) considerado um dos representantes da poesia marginal, escreveu também na linguagem sertaneja. A prova disso está no livro Emoções.
Truvuada
Ao colega José Praxedes, o maior poeta vaqueiro do nordeste
Chuva, relampo e truvão,
Essa noite foi bunito,
So se uvia a exprosão
Pulos artos infinito!
O pai da boa cuaiada
Tava brabo qui nem feria,
E sapecava as espada
Dos relampo nas esferia!
Cabra trimia de medo
Quando as luz alumiava
Sub os serrote e os penedo,
E os curisco os ceu riscava!
Os aniná dos pulero
E os outro dos currá,
Correro tudo ligero,
Pra mode se ocurtá!
Era grande a tempestade,
Paricia tiroteio
Ou metraia de verdade,
Ou o qui dizê nem seio!
Rezava a Nosso Sinhô,
De frieza intiriçado,
E trimendo de pavô!
Uma faisca caiu
Numa oitica veia,
Uma zuadão se uviu
Pru riba de nossas teia!
Pensei cum eu ca cum migo,
O mundão hoje se acaba,
Pru mode qui isso é castigo
Que sub os mortá disaba!
As ventania chiava
Como as cascavé zangada,
E as têia arrebentava
Numa fura indimonhada!
Pru toda parte curria
Um riacho invulumoso,
Os bucho dos rio inchia
Cumo dragão pavoroso!
Qui São Jiromo nas vala,
Pru toda sua bondade,
Rezava as muié na sala
Do meu vizinho e cumpade!
Os truvão arribombava
Cumo bomba de canhão,
Os relampo arrelampava
Como boca de vurcão!
Os chão tava qui nem papa,
Dave lama nos jueio,
Hoje aqui ninguem inscapa,
Tive no imo esse anseio!
Eu tinha me alevantado
E abrido a minha jinela,
Mode inspiá assustado
A frevura da panela!
O ceu simiava um pote
A chuvê chuva pra baxo,
E as terra era um caçote
Merguiando num riacho!
A tão danidas trumenta
Cuma essas do sertão,
Ninhuma corage infrenta,
Nem se fô Napulião!
Mondé
Ao Veríssimo de Melo e ao Câmara Cascudo
Fulô, eu não sou preá,
Mode caí im mondé...
Tu tem no peito, muié,
Um gato maracajá...
A tuarma é cascavé
Pricurando invenená
Meu coração a briá
Chêio de amô e de fé!
Num sou Adão, traidera,
Muié ruim, fuxiquera,
Mode cumê a mação!
És irismã da seipente,
Te finguindo dinucente,
Mode eu caí no arçapão!
FONTE: Milton Siqueira, Emoções. Rio Grande do Norte - 1950.
quarta-feira, 14 de junho de 2023
TERESINHA; 93 ANOS DE FE E VIDA
Teresinha Fernandes, 93 anos completados ontem. Uma mulher que tem a força do sertão dentro si. Natural de Caraúbas, só estudou até a terceira série primária, pois muito cedo teve que assumir a responsabilidade de criar os irmãos. A falta dos bancos escolares não tirou dela a possibilidade de ser doutora na arte de viver. Venceu os obstáculos, e como os rios que descem em busca do mar, Teresinha foi adquirindo sabedoria de vida. Para conhecer mais um pouco sobre ela convido a assistir o vídeo abaixo: A VESTIMENTA DA VIDA -CORDELIZANDO OS DIAS DE TERESINHA.
sábado, 10 de junho de 2023
O DUPLO TÍTULO DO AMÉRICA EM 1919
André Felipe Pignataro - 10.06.2023
quinta-feira, 8 de junho de 2023
segunda-feira, 5 de junho de 2023
ASSIM DISSERAM ELES...
sexta-feira, 2 de junho de 2023
quarta-feira, 31 de maio de 2023
O SOFRIMENTO DO JUMENTO
terça-feira, 30 de maio de 2023
DADOS BIOGRÁFICOS DE GILBERTO ARANHA - O JOVEM ESCRITOR POTIGUAR
Voltemos à conversa sobre Gilberto Aranha. Deixei o leitor sem ter algumas informações sobre ele, porque conforme anunciei, precisava ter certeza sobre elas. Vou enumerá-las:
1) Teria Gilberto Aranha realmente morrido aos 15 anos?
2) Quem foram seus pais?
3) Qual a causa da sua morte?
Para encontrar a resposta a essas perguntas eu sabia que teria que me dedicar à pesquisa. Tinha anotado em minha agenda ir ao cartório solicitar o atestado de óbito do jovem escritor e também mergulharia de forma profunda nos jornais que estão disponíveis na hemeroteca digital da Biblioteca Nacional. Mas, quem tem amigo, tem um tesouro, e eu tenho entre meus amigos, um confrade, um pesquisador, escritor e irmão das Belas Letras. É o André Felipe Pignataro Furtado, que ao ler a minha publicação sobre Gilberto Aranha, foi ele mesmo buscar as respostas que eu ainda iria atrás.
E na manhã de ontem, logo cedo recebi dele as respostas. Portanto, todas as informações que aqui vou mostrar eu devo e agradeço ao leitor e pesquisador André Felipe.
Gilberto Aranha realmente escreveu "Aspectos da Vida" aos quinze anos, embora não tenha publicado. Isso só aconteceu em 1932, o que levou Terra de Senna a deduzir que ele tinha morrido com quinze anos. Acreditando em Terra de Senna, fiz a conta: 1931 -15 = 1916 ( o ano do nascimento).
A conta não bate, pois em 1918 e 1919 vamos encontrar textos de Gilberto Aranha nas revistas Fon-Fon e Tico-Tico, o que comprova ser impossível ele ter nascido em 1916.
Gilberto Aranha nasceu no dia 21 de outubro de 1901, na casa de nº 47, da Rua do Comércio, na Ribeira, sendo filho de Fortunato Rufino Aranha (paraibano) e Bernardina de Oliveira Aranha.
O jovem escritor viveu (29) vinte e nove anos, pois faleceu no dia 23 de janeiro de 1931, às 20 h, na Avenida Nísia Floresta, sendo vítima de colapso. Foi sepultado no Cemitério do Alecrim.
Isso basta por hoje. Nossos aplausos e agradecimentos a André Felipe.
Francisco Martins, 30 de maio de 2023.
A ONÇA DO RIO PARDO (MEMÓRIAS DA MINHA INFÂNCIA)...
Eu devia ter treze anos. Minha irmã mais velha sempre nos levava à fazenda do seu sogro, onde passávamos o fim de semana. A propriedade dista 90 quilômetros da cidade, de maneira que percorremos longa distância sem ver uma única casa. É mato dos dois lados da estrada de terra. Alguns trechos formavam túnel de árvores nativas quilômetros a fio, de maneira que era comum nos depararmos eventualmente com manadas de pacas, antas, capivaras, Caititu (porco do mato), veados, seriemas, tamanduás, jaguatirica, anta, cutia e todo tipo de fauna daquela região.
Obviamente que havia onças-pintadas, mas essas não percorriam locais com barulho, de maneira que só se viam os seus rastros pela estrada ao amanhecer, acaso o motorista descesse do carro. Nas praias dos rios se veem pegadas em abundância.
A fazenda era cortada pelo imenso e caudaloso rio Pardo, que fazia uma curva sinuosa a uns trezentos metros dali. Raros homens adultos empreendiam atravessar esse manancial a nado.
A sede da fazenda guardava um silêncio que nunca mais experimentei. Seus únicos sons são proporcionados pelos pássaros e a bicharada que, de vez em quando, rosna na mata. Durante a noite as matas, campinas e pastos são pincelados de luzinhas vagantes que na verdade são olhos.
Como a própria cidade onde morávamos era emoldurada de matas e rios, não era de estranhar o seu aspecto bucólico, mas vivíamos a experiência interessante do silêncio pleno, luz e geladeira a gás. E sem o lampião, tudo era breu. Ficávamos sentados nos bancos da varanda do casarão, conversando e olhando para aquela placa do horizonte invisível, preto, rompido pelo azul escuro do céu, furado de pontinhos reluzentes. Nunca vi céu mais lindo.
Durante o dia, eu e minha irmã costumávamos percorrer a fazenda, apreciando tudo. A começar por um pequeno rio que ficava atrás do casarão. Rasinho e com nuvens de lambaris.Andávamos no mato à cata de marolo, goivira, ingá e outras frutas do mato, deliciosas e inesquecíveis.
Nesses passeios silvestres gostávamos de correr dentro dos túneis que as capivaras e antas constroem. São caminhos redondos, esculpidos naturalmente pelo vai e vem desses animais dentro dos arbustos altos. Quase um labirinto. Andar por essas tocas era diferente de rasgar o mato à mão para avançá-lo, portanto sentíamos a desenvoltura dos bichos, como se o fôssemos.
Recordo-me de uma experiência com uma onça, certa vez, quando passeava sozinho nesses labirintos misteriosos, mas atraentes. Assim que deixei o túnel, dei-me com as margens do assustador rio Pardo. As águas caudalosas emitem um som único e indescritível. As copas gigantes das árvores parecem seres fantásticos quando sombreiam as águas. É uma presença indescritível de algo que só se sente estando ali.
Na outra margem do rio uma multidão de ariranhas entrava e saia de suas tocas no barranco ribeirinho. Mais adiante, numa pequena enseada, dezenas de capivaras tomavam sol na prainha de areias alvas. Pareciam contemplar o silêncio daquele paraíso. São impressionantes as delícias da natureza. Elas proporcionam um misto de medo e envolvimento irresponsável naquelas peles, naqueles couros, seduzindo-nos.
Eis que nesse estado de natureza olho para a mata ribeirinha e dou-me com a visão de uma onça pintada sobre o braço de imensa ingazeira. Deitada despreocupada e elegantemente. Um portentoso exemplar. Tal e qual essa bela espécie da fotografia aqui postada. Logicamente que não era essa, mas exatamente igual. Havia entre nós a distância da largura de duas BR, de maneira que ela poderia ter-me tornado sua refeição num disparo de segundos. Se eu entrasse na água, elas são excelentes nadadoras. Se eu subisse numa árvore, elas são exímias escaladoras. Correr seria em vão.
Fiquei como um toco, fincado ali sem movimento. Logo aquele ser de beleza extraordinária saltou na água e deu na outra margem, num nado impressionante. As capivaras irromperam dali, desaparecendo como se entrassem nas árvores. Fiquei observando, almejando vê-la novamente, mas a mata era muito fechada. Então disparei para a sede da fazenda. Coração ameaçando sair pela boca.
Doido é quem quer amizade com onça. Para mim, animais silvestres pertencem às matas, devem ser louvados e nada mais. Eles estão no espaço deles. Sempre tive aversão a quem fere qualquer animal. Mas, por falar em onça, as pegadas da onça-pintada assustam. São grandes e carimbam pesadamente o chão. A pata dianteira é bem maior que a traseira. A dianteira tem uns 12 cm de comprimento e uns 13 cm de largura. A pata da pegada traseira tem uns 11 cm de comprimento a 10 cm de largura, com almofada grande e arredondada. Os dedos são arredondados e sem marcas das unhas.
À noite, durante as conversas de lampião, meu cunhado disse que ela estava alimentada, e jamais me faria mal. Ou talvez estivesse interessada na manada de capivaras do outro lado do rio. Talvez ela dormisse naquele momento e minha presença a despertou.
As onças sentem cheiro numa profusão incomparável. São iguais aos indígenas que adivinham alguém chegando de longe. Ele orientou que eu não fosse mais por ali sem companhia. A peonada dali só anda de faca e arma de fogo. As onças se afastam ao menor barulho. Jamais se aproximam de lugar com ronco de motores ou converseiro. Assim também são as sucuris.
Pois bem, essa é a história de uma onça que estava em paz em seu habitat, eu a perturbei, e ela, por alguma razão, me poupou, Seguem outras imagens. Elas, no caso, são imagens reais do rio Pardo contornando a cidade em que nasci. Essas matas tiveram parte comigo. Esse rio conheceu a minha infância. Quantas vezes saltei de sua velha ponte de madeira e nadei até a margem como que acabara de experimentar o feito de um heroi…
AUTOR: Luiz Carlos