segunda-feira, 29 de junho de 2020

ESTRANGEIRISMO E NEOLOGISMO

A gente vai andando pelas ruas da cidade e se deparando com palavras que entram no nosso idioma e nos mostram que não somos totalmente livres. Isso é coisa do ESTRANGEIRISMO em comunhão com o NEOLOGISMO.
Será que nosso idioma precisa realmente delas para que sejamos compreendidos?  "

"Quando nos virá  esplêndida coragem de sermos nós mesmos, como o francês tem coragem de ser francês, e o inglês a de ser inglês, e o alemão a de ser alemão? Quando?" 

Já se preocupava Monteiro Lobato sobre a influência estrangeira, quando escreveu "Arte brasileira" ( Ideias de Jeca Tatu, 1946, p. 196).


 








CICATRIZES

Já estamos no finalzinho do mês de junho de 2020,  e isso implica assegurar que  a metade do ano  passou. Que ano! Pandêmico, onde a morte tem trabalhado de forma acentuada. Ceifou milhares de vidas, a maioria pela famigerada doença da COVID-19.
Mas eu não quero dar publicidade à Dama Apocalíptica, que cavalga  tendo em uma das mãos a  foice insaciável.  Vou escrever sobre a vida e suas cicatrizes. Sim,  pois viver intensamente é colecionar cicatrizes.

Revelarei as minhas. Vou à infância e dela trago três que lembro quando as ganhei. A primeira eu já até escrevi sobre ela no meu livro "Crônicas Sensoriais",  ao escrever a 6ª Lembrança, na qual relato  assim:

        "Aqui começa uma das minhas experiências mais dolorosas, a primeira da minha vida.... Pensei que Mocotó iria me atacar, pisotear, chifrar. E a vaca vinha desengonçada, determinada ao meu encontro. Pus-me a correr em direção a minha minha casa. Vi que o pequeno portão do alpendre estava fechado, restava-me tão somente a cerca de arame farpado. Mocotó corria atrás de mim. o som do chocalho anunciava que ela estava ganhando terreno, eu passava os piores segundos da minha vida. Veloz, e com a adrenalina esvaziando por todos os poros passei por debaixo da cerca, rente ao chão e senti quando o arame farpado com aqueles cravos metálicos rasgou minha carne"

Com o tempo a cicatriz desapareceu. Algumas não ficam para sempre. A segunda, essa sim, permanece comigo, no antebraço direito, é um risco. Como o consegui?  Tia Benigna me presenteou com um boné que tinha duas abas. Na fazenda, numa manhã, estava eu andando com o boné e puxei  a aba até cobrir totalmente os olhos. Nada via e na minha imaginação fiquei andando como se estivesse bêbado, andei e para infelicidade minha, pensei em correr. Se para Drummond havia uma pedra no meio do caminho, no meu, acreditem, havia uma cerca de arame. Novamente uma cerca. Meu braço foi rasgado, sangrou e para não preocupar minha mãe, não fui em busca do socorro materno. Optei em ir lavar o corte  no rio. Tinha meus oito anos. Quarenta e oito anos se foram, mas ela está no meu corpo e teima em me lembrar que um dia eu comecei a encenar.

Fui crescendo e chegaram as cicatrizes da alma. Estas são as que mais doem. Não tenham a curiosidade de saber quais são as minhas. Deixo-as guardadas num baú, no mais íntimo do meu ser. E quando penso que não terei mais cicatrizes, a vida me sinaliza dizendo que ainda não acabou. Elas chegam sem pedir licença, sem dizer se você as quer ou não. O importante é ter a coragem de olhá-las e dizer: O Deus no qual eu creio, ensinou-me através do seu Filho, que cicatrizes são  crônicas escritas no corpo e na alma, na grande trajetória da vida, no caminho da Ressurreição.

Francisco Martins
29 de junho de 2020







domingo, 21 de junho de 2020

UMA CONVERSA SOBRE LIVROS, CORDEL E HISTÓRIAS


DO OFÍCIO DE FAZER QUEIJO - RICOTA

Fazer queijo é um exercício de paciência. Uma atividade bem propícia em tempo de quarentena. Tomei a iniciativa de fazer uma ricota.Cinco litros de leite, da vaquinha Maricota.

Ela mandou deixar em minha casa e com eles um bilhete: "Poeta, segue o que tenho de mais precioso em minhas tetas. Faça um queijo gostoso. Quando precisar de leite não demore em avisar. Maricota terá prazer em poder ajudar".

Levei os cinco litros ao lume. Fiquei sempre por perto do fogão esperando ferver. Leite no fogo é como menino traquino, não merece confiança. Assim que ferveu, desliguei o fogo e acrescentei quatro colheres de vinagre de maçã para cada litro, isso  fará com quê seja coalhado. Misturei por alguns minutos, o tempo necessário para o soro ficar parecendo um mar verde e o leite formar blocos branquinhos que lembram icebergs.

Quando esfriou eu passei o produto por uma peneira, algumas pitadas de sal e fui espremendo para deixar tão somente a massa que formará a ricota.

Lembrando de Maricota, "reclusa" naquele curral de estacas de sabiá, declamei o poema "Vaca Lavandeira", de Patativa do Assaré.

 ...
Ficou uma bezerrinha,
Atacada de manqueira.
O patrão não quis comprá-la,
Tratei dela a vida inteira
E botei na bezerrinha
O nome de Lavandeira.

...
Depois que ela deu bezerro,
Causou admiração.
Vinte e dois litros de leite
Dava sem comer ração:
Ainda mais aumentou
A inveja do patrão.
 ...

E a ricota? Pode perguntar o leitor.
Ela, neste momento descansa. Inerte como uma pedra.

Francisco Martins
20 de junho 2020


sexta-feira, 12 de junho de 2020

ELES CONJUGARAM INTENSAMENTE O VERBO AMAR

Amar, verbo intransitivo - nos disse o poeta Mário de Andrade, em 1927 e muitos séculos antes dele, um outro poeta, Paulo de  Tarso, escreveu uma carta que ainda hoje é eterna. Nela, Paulo de Tarso assegura ser o  AMOR a força maior do homem, superior a Fé e a Esperança.

Hoje, 12 de junho, é comemorado no Brasil, o Dia dos Namorados.  Estes seres que trocam carícias, que se nutrem do amor,  "O Sempre Amor" que canta e encanta a poeta Adélia Prado: ...o amor é coisa que mais quero.

E é em nome desse amor, eterno e transcendental, que eu quero mostrar aos leitores dois testemunhos de casais potiguares que  souberam ser eternos namorados. Refiro-me a Câmara Cascudo/Dahlia e Eider Furtado/Elenita.

Cascudo e Dahlia viveram 57 anos de união (1929-1986). Ele, quando faleceu no dia 30 de julho de 1986, às 16:30h, sua última palavra foi: Dahlia. Ela, por sua vez, também retribuiu o gesto de amor e em 1997, quando estava falecendo pronunciou: Luís, como carinhosamente o chamava. A Conexão entre os dois foi tão forte que faleceram com a mesma idade: 87 anos. Ela partiu 11 anos, exatamente a diferença de idade entre eles. Clique nas imagens e leia os depoimentos de Câmara Cascudo e Eider Furtado sobre suas respectivas namoradas.


Jornal A República
Eider Furtado e  Elenita conviveram 72 anos de casados. Ele faleceu em 6 de novembro de 2019, aos 96 anos de idade. Dona Elenita Furtado, aos 94 anos,  dá e recebe por parte dos filhos, netos e bisnetos o  amor familiar.
 
jornal A República








É de amor igual a estes que o mundo precisa. Amor que edifica, transforma, transcende. Que possamos ter muitos casais como esses. Eles conjugaram intensamente o verbo amar.

Francisco Martins
12 de junho de 2020


Referências

PRADO. Adélia. Poesia Reunida. São Paulo/SP. Editora Record, 2016, p.64 
Jornal  NOVO, Natal/RN -  Domingo 13 de julho 2016, Caderno Cultura. "As 30 maiores curiosidades de Cascudo" ( jornalista Henrique Arruda). p. 12.
Jornal A REPÚBLICA, Natal/RN - 15 de Junho 1956 -  "Namorados de ontem falam do primeiro encontro com os esposos de hoje"  (jornalista  Talis Andrade, fotógrafo José Seabra).
 

quinta-feira, 11 de junho de 2020

CLUBE DE LEITURA MULHERES NEGRAS NA BIBLIOTECA

O poeta Mané Beradeiro estará amanhã à tarde, das 15 às 17 h, participando, como ouvinte, através de uma live,  do Clube de Leitura Mulheres Negras na Biblioteca. O evento é realizado pela Biblioteca Parque Villa-Lobos, que fica no Alto de Pinheiros, em São Paulo-SP. 

Poeta Jarid Arraes

Clube destinado a leitores e não leitores de escritoras negras. Durante encontro será realizada a leitura e troca de impressões de texto de autoria negro-feminina. Nesta edição online, a BVL recebe a participação da escritora Jarid Arraes (foto) para conversar com o público a respeito do texto proposto e sua trajetória. A mediação acontecerá  com  Carine Souza, Beatriz Nogueira e Juliane Sousa.

Jarid Arraes é natural de Juazeiro do Norte- CE, mas mora em São Paulo, capital, desde 2014 e seus textos, em prosa ou poesia (cordéis),  tem a bandeira da luta e consciência negra. Arraes possui vários livros publicados.

Para saber mais sobre a escritora visite: http://jaridarraes.com/

Francisco Martins
11 de junho de 2020

ZÉ DA JIA - UM POTIGUAR ARRETADO

Foi o poeta Marcos Medeiros quem criou o personagem Zé da Jia.  Um jovem que faz parte do lúdico de muitas crianças do Rio Grande do Norte.  Vejamos como o próprio criador apresenta sua criação, no poema "Quem é mesmo Zé da Jia"

Eu criei um personagem
que eu chamei de Zé da Jia.
Ele adora fantasia,
vivendo em mental viagem.
Narrativa e reportagem
na sua vida é presente.
Fala de forma eloquente,
de maneira firme e forte.
DO RIO GRANDE DO NORTE,
ZÉ DA JIA É BEM DA GENTE.


Zé da Jia respira desde o  mês de maio de 2015, quando saiu a primeira revista, através da LerMais Editora, em edição colorida, com oito páginas, no formato 21 x15 cm. O texto, sempre escrito em cordel, de autoria de Marcos Medeiros e as ilustrações  de Marcelo Quirino.


 Este trabalho não passou despercebido pelo crítico Thiago Gonzaga, que assim se pronunciou sobre a revista, em 8 de junho de 2015.

O escritor Marcos Medeiros, publicou recentemente o cordel em quadrinhos “Zé da Jia”, que além de entreter e alegrar, sobretudo a criançada, tem uma notória intenção, na própria sequência dos quadrinhos, de promover o desenvolvimento cognitivo das crianças, na medida em que elas raciocinam, refletem, e preveem o quadrinho subsequente, acompanhando a sua leitura.
Os quadrinhos, na grande maioria das vezes, são histórias narradas a partir da estrutura que sintoniza o desenho e a fala; constituem gênero discursivo associado às linguagens verbal e imagética, envolvendo elementos como personagens, tempo, espaço e acontecimentos organizados em sequência, numa relação de causa e efeito. É o que acontece com a história de “Zé da Jia”, quando este, nascido no Estado do Rio Grande do Norte, vai investigar suas origens e o motivo do seu apelido.
Ao invés de usar a expressão verbal, que costuma aparecer nos balões, o autor utilizou o cordel, associado a imagens. O uso de imagens e a representação de gestos compõem a linguagem não verbal.
A sequência de imagens do gibi de Marcos Medeiros, como a dos quadrinhos, colabora, muita vezes, para que a própria criança compreenda melhor o sentido da história, antes mesmo de aprender a ler. Ela vai conseguir entender muito do que trata a revista através das imagens. Sem dúvidas, a leitura de gibis é uma atividade lúdica para as crianças, que naturalmente se identificam com a linguagem dos quadrinhos e, muitas vezes, estabelecem uma relação afetiva com seus personagens. É o que acontece, por exemplo, com o personagem Zé da Jia, que tenta descobrir, por intermédio de um ancião, a origem do seu apelido.
A intenção da revista de Marcos Medeiros, bem, como a de outros quadrinhos e formas de arte, faz parte de um contexto, seja ele histórico ou social. São na verdade um instrumento de mensagem e, sobretudo de aprendizado. Iniciativa portanto muito válida.
 
Marcos Medeiros

 A Revista Ze da Jia tem os mais variados assuntos: ecologia, turismo, história, biografia, profissões, folclore, esporte, saude, etc. Ao todo já são 25 edições com temas relevantes que edificam o leitor. Todos os textos em forma de cordel, o que muito ajuda no processo de leitura das crianças, por ter este gênero textual uma cadência sonora, proporcionando prazer, no ato de ler.






 Francisco Martins
11 de junho de 2020

Referências:

 https://www.recantodasletras.com.br/cordel/6102917
https://www.facebook.com/marcos.medeiros.7946

ASSIM DISSERAM ELES ...

"Não é matando o coração de homem que o tornamos melhor"

Monteiro Lobato

Fonte:  Na Antevéspera. In: Literatura de cárcere. São Paulo/SP. Editora Brasiliense, 1946. p. 86

domingo, 7 de junho de 2020

sexta-feira, 5 de junho de 2020

O PADEIRO DE JESUS



Shalon Adonai!

Moro na cidade santa,

A Jerusalém histórica

Onde bate meu coração.

Sou judeu, trabalhador,

Com as mãos eu sovo a massa

E é ela meu ganha-pão.

Sou padeiro de profissão.


Trabalho de madrugada,

Junto ao forno, com calor,

Mas permitam-me relatar

Algo sobrenatural

Que aconteceu comigo

E mexeu com meu fervor.


Era o tempo  da Páscoa

A cidade estava cheia

Muitos pães encomendados

Tinha eu para fazer

Quando chegou uma mulher

E pediu um pão maior.


“Esse pão” – falou ela – “vai às mãos de um santo”.

Os meus pães são poemas

Que escrevo com o trigo,

Ponho água e ponho sal,

Come-se sem correr perigo.


E eu fui fazer o pão.

Nunca, em toda minha profissão,

Vi um fato como aquele.

Ao sovar o pão da ceia.

Cada vez que eu batia

O meu coração doía,

Via sangue na bacia.


Eu pensei que estava louco!

Como pode isso ser?

O pão em minhas mãos

Gemia, sangrava e eu sem saber o porquê.

Troquei pra outra bacia

E fui terminar o pão.

Ouvi vozes de soldados, gritos de multidão

Quando vi na massa abrir, sulcos de chicoteação.


Eu caí naquele chão e supliquei ao meu Senhor:

Que se passa? O que é isso?

Foi aí que apareceu um anjo na oração

A resposta estava dada. Entendi forte visão.

Eu fui por Ele escolhido pra sovar aquele pão,

Símbolo do sacrifício, do corpo todo moído,

Servido na crucificação.


O pão feito por mim, por Jesus foi abençoado,

Por Ele mesmo rasgado e dado aos seguidores.

Dele comeu os Apóstolos, um por um recebeu

E eu, de longe vi o Pão Vivo descido do Céu.

 

Francisco Martins

Parnamirim-RN – 05 de junho de 2020