domingo, 24 de fevereiro de 2019

O RETRATO DE JAYME ADOUR DA CÂMARA



Por Ricardo M. Sobral, advogado e membro da ACLA

O título deste artigo não foi inspirado no Romance Filosófico de Oscar Wilde - O Retrato de Dorian Gray.
Como se verá mais adiante, mais aproriado seria buscar inspiração no cinema: três homens e um só destino. Circula nos meios culturais do estado que Jayme Adour teria sido retratado por Cândido Portinari, o mais importante pintor brasileiro de todos os tempos. A versão teria surgido de um comentário do jornalista Luiz Lobo, que escreveu o livro A Arte o Rabo de Galo, ilustrado por Leopoldo, filho de Jayme.
O Retrato existe, porém, não parido pelo pincel de Portinari. Como amigo e até certo ponto liderado de Adour, Portinari marcou várias vezes para fazer o retrato, mas Jayme, sempre movimentado, elétrico, viajante, cheio de compromisso, não tinha tempo.
Não obstante, Jayme ficou com um bom acervo de pinturas de Portinari. O pintor não tinha dinheiro para compra livros. Jayme emprestava. Portinari devolvia todos com a folha de rosto ilustrada com suas pinturas. Dona Leonor, viúva de Jayme, cedeu esses livros para Candinho, filho de Portinari. Estão na Fundação Portinari. Portinari, que morreu em 1962 intoxicado com  tintas que usava em seus trabalhos, era filho de imigrantes italianos. Nasceu em fazenda de café de Brodowisk, interior de São Paulo em 1903. Não chegou a concluir o curso primário. Seus trabalhos mais festejados são a tela "O Lavrador de Café" e o painel "Guerra e Paz", este de propriedade da Onu. Em 1945 concorreu pelo PCB a uma vaga na Câmara Federal e em 1947 ao Senado, sem, contudo, obter êxito.
O retrato de Jayme foi pintado por Dimitri Ismailovitch, artista plástico nascido na Ucrânia (1810), e falecido no Rio de Janeiro em 1976. O ucraniano, antes de estabelecer-se no Rio de Janeiro em 1927, estudou na Escola das Belas Artes da Ucrânia, passou sete anos em Istambul estudando arte bizantina e persa, com passagem pelos Estados Unidos, Londres e Atenas. Contemporâneo de Portinari, pintou a intelectualidade brasileira do eixo Rio-São Paulo entre as décadas de 30 e 50. Seus retratos de Villa Lobos e de Lily Marinho valem uma fortuna.
Jayme Adour da Câmara, patrono de uma das cadeiras da Academia Cearamirinense de Letras e Artes - ACLA-PSN, nasceu no Engenho São Leopoldo em 1898, de onde saiu montado num carro puxado por uma junta de boi para nunca mais voltar.
Foi jornalista, escritor, empresário, fundador da primeira agência de notícias do Brasil e o homem mais viajado do seu tempo.
Foi um dos expoentes do movimento modernista brasileiro, chegando a presidir a Revista da Antropofagia, veículo oficial de divulgação das idéias modernistas. Era um homem de posições firmes e claras. Enfrentou sozinho a ira da ditadura Vargas e as togas do STF ao se opor veementemente à entrega da judia Olga à Gestapo.
Foi quem no Brasil primeiro leu Marcel Proust; embora o macaibense Otacílio Alecrim tenha sido quem mergulhou com mais profundidade no complexo mundo proustiano, cuja obra prima tem como personagem principal o tempo.
O principal livro de Jayme é "Oropa, França e Bahia",  onde relata suas viagens pelo então vasto mundo, hoje apenas uma 'Aldeia Global' (H.M.McLuhan).
Jayme Adour faleceu de infarto fulminante em março de 1964 no Rio de Janeiro, debruçado sobre a máquina de escrever.

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