O poeta Mané Beradeiro disponibilizou pelas redes sociais, na semana passada, o texto completo do seu mais recente poema construído no estilo de cordel. Três cabras de Jesus Cristo - Santos juninos sim senhor! trata sobre o universo celebrado no tradicional mês junino, quando são festejados os santos Antonio, João Batista e Pedro. O poeta construiu o texto com 38 estrofes, sendo 37 sextilhas e 1 décima. A arte da capa foi feita por Flávio Barjes, poeta e capista do norte do Brasil.
1
No Nordeste do Brasil
Todo ano, mês de junho,
As cidades ficam lindas
E dão grande testemunho,
Festejando homens santos,
Corajosos e de punho.
2
É o mês mais musical,
Com forró de pé de serra;
Tem quadrilhas pelas ruas,
Bandeirolas pela terra;
Estouram fogos nos ares,
Mas é paz e não a guerra.
3
As comidas destas festas
Trazem o cheiro da infância,
Que ficou lá no passado,
Eu vejo hoje à distância,
Lembro bem da minha mãe
Cozinhando com abundância.
4
A canjica tão bem feita
Com açúcar, milho, leite;
A panela vai ao fogo
E se mexe sem enfeite;
Quando fica cozinhada,
Não falta quem aproveite.
5
Se você nunca raspou
A panela da canjica,
Não sabe o que é gostoso,
Como é que a gente fica,
Tão feliz igual a gato
Dormindo dentro da bica
6
A Pamonha é coisa boa
Dá gosto dela comer;
Estando doce ou salgada,
Enche o bucho pode crer;
É um trabalho danado
Essa comida fazer.
7
A canjica quando deita,
Veste o prato de amarelo.
A pamonha costurada,
Mais parece Chica Melo,
Quando põe camisolão
Pra dormir com Gracielo.
8
Pra tirar a timidez,
O quentão e a catuaba.
Se beber em demasia,
Vai cair como mangaba.
Se pensou ser tubarão,
Não deixou de ser piaba.
9
Eu direi neste cordel
Os santos que são lembrados:
Santo Antonio, dia 13,
Que atende os apaixonados.
Vitalinas fazem preces
E cadê os resultados?
10
Santo Antonio traz nos braços
O menino Salvador;
Tem moça desesperada
Que causa grande terror,
Escondendo Jesus Cristo,
Só devolve com favor.
11
“Só verá o seu menino
Se meu desejo atender.
Consiga-me um namorado.
Pode-me surpreender.
Se avexe, meu Santo Antônio,
Quero meu noivo escolher!”
12
Será que o santo é machista?
Não atende quarentona?
A solteira da Raimunda
Tomou banho de acetona,
Foi pro baile bem faceira,
Namorar Pedro Azeitona.
13
A fogueira foi acesa
Na noite de Santo Antônio.
Desceu Raimunda a ladeira,
Balançando o patrimônio.
Diz Pedro Azeitona ao vê-la:
“Eita , que poço de hormônio!”
14
Santo Antonio, lá do Céu,
Sentiu cheiro de chouriço
E Ficou todo encantado
Com aquele reboliço.
Viu Raimunda namorar,
- Terá o amor um feitiço?
15
São três santos celebrados,
Dois ainda vou falar:
João Batista com São Pedro
Cada um mais singular
Suas vidas nos ensinam
A quem devemos olhar.
16
Em 24 de junho
São João Batista é lembrado.
O seu pai foi Zacarias,
Em Isabel foi gerado.
Nasceu bem antes do primo,
Esse profeta arretado
17
Não vestiu roupas de marcas,
E tampouco o mar cruzou.
Mas um dia um gesto seu
O seu primo revelou,
Mostrando Jesus, o Cristo,
O Cordeiro que chegou.
18
Por isso que na bandeira
Tem ele com carneirinho,
Lembrando ser o profeta
Que sabia direitinho.
Com João não tem arrodeios,
Mostrou bem certo o Caminho.
19
Tem o fato, tem a lenda,
É preciso separar.
Um real, outro inventado,
Enfeitam nosso sonhar.
Bem assim são as fogueiras
Sobre elas vou falar.
20
Isabel foi visitada
Por alguém de Nazaré.
A jovem, bela Maria,
Casada com São José,
Que já esperava Jesus,
A razão da minha fé.
21
Naquele tempo distante
Telefone não havia.
Isabel teve a ideia
E disse para Maria,
Quando João fosse nascer
A fogueira acenderia.
22
Preservou a tradição
E a lenda foi espalhada.
Por isso que ainda hoje,
A fogueira é preparada,
Lembrando que João nasceu
De uma idosa, já cansada.
23
Quando criança brinquei
Com a fogueira abrasada.
No calor daquela lenha,
Promessa bem confirmada.
Parentesco que surgia
Naquela festa animada.
24
“Eu serei teu afilhado,
Tu serás o meu padrinho.
A fogueira testemunha,
Confirmada por Joãozinho.
É ordem de Jesus Cristo,
Recebida por Pedrinho”
25
Vamos celebrar São Pedro,
Já chegando o fim do mês.
29 é seu o dia,
Sabe eu, tu e vocês.
O santo mais estressado
Vou dizer em um, dois, três.
26
Um – nasceu em Betsaida,
Pescador da Galiléia.
Tinha nome de Simão,
E teimava igual a ‘véia’
Jesus Cristo disse: “Venha
Fazer parte da colmeia.”
27
Dois – seu nome foi mudado,
E Pedro passou a ser.
Vivendo com Jesus Cristo,
Muito pôde aprender,
Pois tendo o pavio curto,
Precisou se converter.
28
Três - prometeu não negar
O Mestre que lhe ensinou
Ser o amor força maior
Que o homem já encontrou.
Pedro foi fraco em ação
Pois a seu mestre negou
29
E Jesus, onisciente,
Disse: Arrepare, bichim
O galo hoje só canta
Depois que negares a mim,
Três vezes encarriado
Tu farás sem um pantim.
30
Pois agora vou contar
Como Pedro se vingou.
É lenda, não tá na Bíblia,
Foi vovô quem me contou.
Pedro saiu com facão
Procurando quem cantou.
31
E naquela madrugada,
A coisa só piorou.
Pedro pulava portão
E muitos galos matou.
Galinhas enviuvaram
E nem um frango escapou.
32
Quando o dia amanheceu,
Pedro viu o mal que fez.
Viu que o errado era ele
Foi tamanha estupidez,
Sentiu que seu coração
Era terra de aridez.
33
E Pedro pôs-se a chorar:
Negar Jesus foi demais,
Pois um homem como aquele
Não veria outro jamais.
Era seu porto seguro,
O fenomenal do cais.
34
Acendeu uma fogueira,
Na brasa pôs o passado.
O fogo que nele ardeu
Fez de Pedro um transformado.
Era agora diferente,
Pescador santificado.
35
“Tem as chaves lá do Céu”
Diz o povo em seu falar.
Foi promovido por Cristo
Abre a porta, deixa entrar
Aqueles que Jesus manda
No Paraíso habitar
36
Vou concluir o cordel,
Pois a festa tá bonita.
Quero comer da pamonha,
Usar camisa de chita,
Ver o povo no salão
Se atolando na birita.
37
Faço votos que o leitor
Guarde a nossa tradição,
A cultura popular
Tão repleta de emoção,
Riqueza dos brasileiros
Que fazem esta nação.
38
M eu abraço e paz eu lhe dou
B ote água nesta chaleira
E stou indo lá na feira
R ua da Consolação
A trás duma fruta-pão
D ela sou um grande fã.
E se for com ribaçã,
I sso fica na memória.
R eforça bendita glória
O café desta manhã.
Mané Beradeiro
11 de maio de 2019
1
No Nordeste do Brasil
Todo ano, mês de junho,
As cidades ficam lindas
E dão grande testemunho,
Festejando homens santos,
Corajosos e de punho.
2
É o mês mais musical,
Com forró de pé de serra;
Tem quadrilhas pelas ruas,
Bandeirolas pela terra;
Estouram fogos nos ares,
Mas é paz e não a guerra.
3
As comidas destas festas
Trazem o cheiro da infância,
Que ficou lá no passado,
Eu vejo hoje à distância,
Lembro bem da minha mãe
Cozinhando com abundância.
4
A canjica tão bem feita
Com açúcar, milho, leite;
A panela vai ao fogo
E se mexe sem enfeite;
Quando fica cozinhada,
Não falta quem aproveite.
5
Se você nunca raspou
A panela da canjica,
Não sabe o que é gostoso,
Como é que a gente fica,
Tão feliz igual a gato
Dormindo dentro da bica
6
A Pamonha é coisa boa
Dá gosto dela comer;
Estando doce ou salgada,
Enche o bucho pode crer;
É um trabalho danado
Essa comida fazer.
7
A canjica quando deita,
Veste o prato de amarelo.
A pamonha costurada,
Mais parece Chica Melo,
Quando põe camisolão
Pra dormir com Gracielo.
8
Pra tirar a timidez,
O quentão e a catuaba.
Se beber em demasia,
Vai cair como mangaba.
Se pensou ser tubarão,
Não deixou de ser piaba.
9
Eu direi neste cordel
Os santos que são lembrados:
Santo Antonio, dia 13,
Que atende os apaixonados.
Vitalinas fazem preces
E cadê os resultados?
10
Santo Antonio traz nos braços
O menino Salvador;
Tem moça desesperada
Que causa grande terror,
Escondendo Jesus Cristo,
Só devolve com favor.
11
“Só verá o seu menino
Se meu desejo atender.
Consiga-me um namorado.
Pode-me surpreender.
Se avexe, meu Santo Antônio,
Quero meu noivo escolher!”
12
Será que o santo é machista?
Não atende quarentona?
A solteira da Raimunda
Tomou banho de acetona,
Foi pro baile bem faceira,
Namorar Pedro Azeitona.
13
A fogueira foi acesa
Na noite de Santo Antônio.
Desceu Raimunda a ladeira,
Balançando o patrimônio.
Diz Pedro Azeitona ao vê-la:
“Eita , que poço de hormônio!”
14
Santo Antonio, lá do Céu,
Sentiu cheiro de chouriço
E Ficou todo encantado
Com aquele reboliço.
Viu Raimunda namorar,
- Terá o amor um feitiço?
15
São três santos celebrados,
Dois ainda vou falar:
João Batista com São Pedro
Cada um mais singular
Suas vidas nos ensinam
A quem devemos olhar.
16
Em 24 de junho
São João Batista é lembrado.
O seu pai foi Zacarias,
Em Isabel foi gerado.
Nasceu bem antes do primo,
Esse profeta arretado
17
Não vestiu roupas de marcas,
E tampouco o mar cruzou.
Mas um dia um gesto seu
O seu primo revelou,
Mostrando Jesus, o Cristo,
O Cordeiro que chegou.
18
Por isso que na bandeira
Tem ele com carneirinho,
Lembrando ser o profeta
Que sabia direitinho.
Com João não tem arrodeios,
Mostrou bem certo o Caminho.
19
Tem o fato, tem a lenda,
É preciso separar.
Um real, outro inventado,
Enfeitam nosso sonhar.
Bem assim são as fogueiras
Sobre elas vou falar.
20
Isabel foi visitada
Por alguém de Nazaré.
A jovem, bela Maria,
Casada com São José,
Que já esperava Jesus,
A razão da minha fé.
21
Naquele tempo distante
Telefone não havia.
Isabel teve a ideia
E disse para Maria,
Quando João fosse nascer
A fogueira acenderia.
22
Preservou a tradição
E a lenda foi espalhada.
Por isso que ainda hoje,
A fogueira é preparada,
Lembrando que João nasceu
De uma idosa, já cansada.
23
Quando criança brinquei
Com a fogueira abrasada.
No calor daquela lenha,
Promessa bem confirmada.
Parentesco que surgia
Naquela festa animada.
24
“Eu serei teu afilhado,
Tu serás o meu padrinho.
A fogueira testemunha,
Confirmada por Joãozinho.
É ordem de Jesus Cristo,
Recebida por Pedrinho”
25
Vamos celebrar São Pedro,
Já chegando o fim do mês.
29 é seu o dia,
Sabe eu, tu e vocês.
O santo mais estressado
Vou dizer em um, dois, três.
26
Um – nasceu em Betsaida,
Pescador da Galiléia.
Tinha nome de Simão,
E teimava igual a ‘véia’
Jesus Cristo disse: “Venha
Fazer parte da colmeia.”
27
Dois – seu nome foi mudado,
E Pedro passou a ser.
Vivendo com Jesus Cristo,
Muito pôde aprender,
Pois tendo o pavio curto,
Precisou se converter.
28
Três - prometeu não negar
O Mestre que lhe ensinou
Ser o amor força maior
Que o homem já encontrou.
Pedro foi fraco em ação
Pois a seu mestre negou
29
E Jesus, onisciente,
Disse: Arrepare, bichim
O galo hoje só canta
Depois que negares a mim,
Três vezes encarriado
Tu farás sem um pantim.
30
Pois agora vou contar
Como Pedro se vingou.
É lenda, não tá na Bíblia,
Foi vovô quem me contou.
Pedro saiu com facão
Procurando quem cantou.
31
E naquela madrugada,
A coisa só piorou.
Pedro pulava portão
E muitos galos matou.
Galinhas enviuvaram
E nem um frango escapou.
32
Quando o dia amanheceu,
Pedro viu o mal que fez.
Viu que o errado era ele
Foi tamanha estupidez,
Sentiu que seu coração
Era terra de aridez.
33
E Pedro pôs-se a chorar:
Negar Jesus foi demais,
Pois um homem como aquele
Não veria outro jamais.
Era seu porto seguro,
O fenomenal do cais.
34
Acendeu uma fogueira,
Na brasa pôs o passado.
O fogo que nele ardeu
Fez de Pedro um transformado.
Era agora diferente,
Pescador santificado.
35
“Tem as chaves lá do Céu”
Diz o povo em seu falar.
Foi promovido por Cristo
Abre a porta, deixa entrar
Aqueles que Jesus manda
No Paraíso habitar
36
Vou concluir o cordel,
Pois a festa tá bonita.
Quero comer da pamonha,
Usar camisa de chita,
Ver o povo no salão
Se atolando na birita.
37
Faço votos que o leitor
Guarde a nossa tradição,
A cultura popular
Tão repleta de emoção,
Riqueza dos brasileiros
Que fazem esta nação.
38
M eu abraço e paz eu lhe dou
B ote água nesta chaleira
E stou indo lá na feira
R ua da Consolação
A trás duma fruta-pão
D ela sou um grande fã.
E se for com ribaçã,
I sso fica na memória.
R eforça bendita glória
O café desta manhã.
Mané Beradeiro
11 de maio de 2019