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quinta-feira, 23 de abril de 2020

CRÔNICAS DA GRATIDÃO - LEMBRANÇA III - MEU AMIGO BRAZ

Na crônica de hoje eu quero prestar homenagem a Braz. Somos amigos desde o dia 6 de julho de 1973.Isso mesmo, em julho deste ano 2020 estaremos celebrando 47 anos de amizades.  Sejamos sinceros, quantos amigos ou amigas você tem que pode contar com mais de quatro décadas de convívio?

Braz  e eu tínhamos muito em comum quando éramos crianças. Vivíamos em ambientes rurais.   Eu tinha nove anos e ele  onze.  Braz não tinha irmãos e seus pais eram trabalhadores de uma fazenda na qual havia um castelo. Castelo? Sim!  E bem distante do Brasil, do outro lado do mundo.

Eu o conheci  através da leitura, quando meus pais trouxeram aquele presente que ainda hoje vive em minha biblioteca. Um romance escrito pela Condessa de Ségur, cujo título é: "Braz e a Primeira Comunhão". Braz pobre, menino sofrido, filho de uma mulher com personalidade forte.  Um livro cheio de ensinamentos sobre perdão, amor, obediência, fé, gratidão.  

Impossível dizer que o livro não tenha deixado marcas na minha personalidade, no meu caráter. Mamãe e papai devem ter escolhido  com muito carinho este amigo Braz.
 
Meu pai

Uma das coisas que me chamava atenção era o nome da autora: Condessa de Ségur. Como já conhecia a turma de Monteiro Lobato eu imaginava ser a autora uma conhecida do Visconde de Sabugosa. 
 
Minha mãe

Braz continua lá dentro daquele livro. o tempo para ele ainda é o mesmo, as páginas continuam na mesma numeração e a sequencia da sua vida nem aumentou nem tampouco diminuiu.

Quanto a minha história continua sendo escrita, não pela Condessa de Ségur, mas por outro escritor, que me viu antes de aparecer no ventre materno, que sabe quando me deito e levanto, para Ele nada há de escondido. E a este Escritor faço o mesmo pedido do Rei Davi:  "Sonda-me,  ó Deus,  e conhece o meu coração; prova-me, e conhece as minhas inquietações. Vê se em minha conduta algo te ofende, e dirige-me pelo caminho eterno" (Salmo 139:23-24).

Francisco Martins
23 abril 2020
Parnamirim-RN 

Da mesma série:

A casa de Otto Guerra 
A Garagem 
Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração; prova-me, e conhece as minhas inquietações.
Vê se em minha conduta algo que te ofende, e dirige-me pelo caminho eterno.

Salmos 139:23,24

Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração; prova-me, e conhece as minhas inquietações.
Vê se em minha conduta algo que te ofende, e dirige-me pelo caminho eterno.

Salmos 139:23,24













  

segunda-feira, 2 de março de 2020

CRÔNICAS DA GRATIDÃO - LEMBRANÇA II - A CASA DE OTTO GUERRA

Eu estava  com 18 anos quando me encantei com aquele  castelo e o tesouro que nele havia.  Nunca imaginei em minha vida que alguém pudesse ser tão rico  como ele.  Fiquei parado naquela janela, admirando o mundo que existia ali dentro, até esqueci de chamar  a pessoa e pedir a encomenda que tinha ido buscar.
Professor Otto Guerra
 Lembro o dia da semana e o ano, uma quinta-feira à tarde de 1982. O endereço também nunca esqueci: Rua Coronel José Pinto, nº 277,  Cidade Alta. Naquele ano eu trabalhava como Assessor  de Imprensa da Arquidiocese de Natal - no Gabinete do Arcebispo Metropolitano - Dom Nivaldo Monte. Entre meus afazeres estava a responsabilidade de escrever e editar o Boletim Informativo da Arquidiocese de Natal que circulava de forma gratuita pelas paróquias, levando as notícias principais da Igreja local. A última página do B.I era reservada para o Editorial, que na maioria das vezes tinha como autor o Professor Otto de Brito Guerra. Recebi a incumbência de ir pessoalmente à casa do Professor Otto Guerra e pegar o editorial. Caminhei da Praça Pio X até a casa dele. Cheguei, abri o pequeno portão de ferro e fui à janela, ia bater palmas e chamar pelo Professor Otto Guerra, quando fui surpreendido com aquela visão da biblioteca. Nunca tinha visto nada igual dentro de uma residência. Muitas estantes, todas repletas de livros. Fiquei em êxtase! Aquela pequena janela, gradeada, serviu de moldura para o quadro mais lindo que até então meus olhos contemplaram. Como senti vontade de viver ali, de fazer parte daquele espaço. 
Francisco Martins e a casa de Otto Guerra
Quando dei por mim vi que o Professor Otto Guerra estava do outro lado da janela, olhando para mim e perguntando o que queria. Fiquei todo perdido. Embaraçado  ainda perguntei se ele realmente morava ali. "Sim - esta é a minha casa. Quem é você?". Disse ser o rapaz que veio buscar o Editorial para o B.I. Ele foi até a máquina de escrever e trouxe o texto. Saí dali  pensando no tesouro que tinha o Professor Otto de Brito Guerra. Aquele dia foi inesquecível, conheci um homem que amava os livros de forma intensa, que dava prioridade a eles em sua casa. Como fiquei grato em ter voltado muitas vezes àquela casa.


Hoje, depois de tantos anos, a casa é a sede do Instituto Otto Guerra. Os livros continuam lá. Otto com certeza está no Céu, deliciando-se com todos os livros que não leu na sua existência terrena e também  lendo os que ainda serão escritos. Tomara que ele leia esta crônica.

Francisco Martins
Parnamirim-RN - 02 de março 2020

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

CRÔNICAS DA GRATIDÃO - LEMBRANÇA I – A GARAGEM


Pede o meu coração para começar a escrever uma nova série de crônicas. Pede não, ordena, pois o coração é senhor na nossa existência. Já  escrevi “Crônicas Sensoriais” que tratam da minha infância, “Crônicas da Saudade” que registram meu tempo de seminarista e agora vou lembrar de pessoas que foram tão especiais em minha vida, vou chamar este conjunto de Crônicas da Gratidão.




Começo pelo casal Rivadávia Pereira  Pacheco e Idalina Correia Pacheco. Eles moravam na Rua Boa Ventura de Sá, Centro de Ceará-Mirim-RN. Por algum período os meus pais moraram em frente, eu era criança, tinha  meus nove anos. Ele já estava na casa dos sessenta e um anos e ela cinquenta e cinco. Eu percebi que quando eles saiam de carro e voltavam Dona Idalina sempre descia para abrir a garagem. Um dia eu tomei a iniciativa  de abrir, tão logo eles chegaram. Não esperei ela descer, corri, atravessei a rua e puxei o ferrolho que trancava o portão da garagem. Um gesto tão simples, que me rendeu um sorriso do casal.

Dali em diante eu sempre ficava alerta. Algumas semanas depois,  Doutor Rivadávia e Dona Idalina um dia chegaram com um presente para mim, um livro infantil, grande e colorido. Nossa,  como fiquei feliz! Agradeci e fui mostrar  a mamãe.

─ Por que eles lhe deram o livro?

─ Porque eu sempre abro o portão da garagem quando eles chegam.

─ Agradeceu?

─ Sim

Não sei dizer com exatidão qual foi a data e o dia que isso aconteceu, pois a minh’alma não teve a preocupação de registrar a efemeridade do tempo, guardou no entanto a essência do gesto daquele casal que se preocupou em presentear uma criança com um livro.  Isso eu nunca esqueci.

No dia seguinte, na escola, eu mostrei aos meus colegas o que tinha ganhado do Dr. Rivadávia e Dona Idalina.  Olhares diversos, várias mãos e muitas bocas viam, tocavam e perguntavam o que eu era deles.

Com um sorriso eu respondia:

─ Sou amigo!

Quanta prepotência minha, espalhar que era amigo de duas pessoas tão nobres e conhecidas na cidade. O certo é que tive o carinho deles. Recebi incentivo para ser leitor que mais tarde, bem mais tarde, aos quarenta anos chegava ao patamar de escritor. Não tenho nenhuma dúvida que eles contribuíram para isso.

 Dona Idalina viveu 74 anos (1918-1992), Doutor Rivadávia foi mais longevo, partiu 13 anos depois da sua esposa. Estava com 93 anos.
Ouso pensar que o fato de Dona Idalina ter partido antes do seu esposo teve um objetivo, ela ficou na porta do Céu aguardando a chegada dele. "Muitos anos esperando!" Pode pensar o leitor, mas do outro lado, na eternidade não existe tempo. E some-se a isto o fato de que o amor é a única virtude que consegue  nos acompanhar na passagem.
Hoje, a garagem da vida continua abrindo e fechando o portão da existência, tomara que haja  nestes lugares a presença de pessoas tão bondosas quanto o casal que eu tive a felicidade de conhecer. 


Francisco Martins – 22 de fevereiro de 2020.