quarta-feira, 4 de outubro de 2023
PAULA BELMINO TEM ENCONTRO COM ALUNOS DA ESCOLA MARIA FRANCINETE
quinta-feira, 22 de junho de 2023
DA VEZ QUE MILTON SIQUEIRA ESCREVEU COMO POETA MATUTO
O Poeta Milton Siqueira (1911-1988) considerado um dos representantes da poesia marginal, escreveu também na linguagem sertaneja. A prova disso está no livro Emoções.
Truvuada
Ao colega José Praxedes, o maior poeta vaqueiro do nordeste
Chuva, relampo e truvão,
Essa noite foi bunito,
So se uvia a exprosão
Pulos artos infinito!
O pai da boa cuaiada
Tava brabo qui nem feria,
E sapecava as espada
Dos relampo nas esferia!
Cabra trimia de medo
Quando as luz alumiava
Sub os serrote e os penedo,
E os curisco os ceu riscava!
Os aniná dos pulero
E os outro dos currá,
Correro tudo ligero,
Pra mode se ocurtá!
Era grande a tempestade,
Paricia tiroteio
Ou metraia de verdade,
Ou o qui dizê nem seio!
Rezava a Nosso Sinhô,
De frieza intiriçado,
E trimendo de pavô!
Uma faisca caiu
Numa oitica veia,
Uma zuadão se uviu
Pru riba de nossas teia!
Pensei cum eu ca cum migo,
O mundão hoje se acaba,
Pru mode qui isso é castigo
Que sub os mortá disaba!
As ventania chiava
Como as cascavé zangada,
E as têia arrebentava
Numa fura indimonhada!
Pru toda parte curria
Um riacho invulumoso,
Os bucho dos rio inchia
Cumo dragão pavoroso!
Qui São Jiromo nas vala,
Pru toda sua bondade,
Rezava as muié na sala
Do meu vizinho e cumpade!
Os truvão arribombava
Cumo bomba de canhão,
Os relampo arrelampava
Como boca de vurcão!
Os chão tava qui nem papa,
Dave lama nos jueio,
Hoje aqui ninguem inscapa,
Tive no imo esse anseio!
Eu tinha me alevantado
E abrido a minha jinela,
Mode inspiá assustado
A frevura da panela!
O ceu simiava um pote
A chuvê chuva pra baxo,
E as terra era um caçote
Merguiando num riacho!
A tão danidas trumenta
Cuma essas do sertão,
Ninhuma corage infrenta,
Nem se fô Napulião!
Mondé
Ao Veríssimo de Melo e ao Câmara Cascudo
Fulô, eu não sou preá,
Mode caí im mondé...
Tu tem no peito, muié,
Um gato maracajá...
A tuarma é cascavé
Pricurando invenená
Meu coração a briá
Chêio de amô e de fé!
Num sou Adão, traidera,
Muié ruim, fuxiquera,
Mode cumê a mação!
És irismã da seipente,
Te finguindo dinucente,
Mode eu caí no arçapão!
FONTE: Milton Siqueira, Emoções. Rio Grande do Norte - 1950.
sexta-feira, 13 de agosto de 2021
O CIRCO CHEGOU
segunda-feira, 12 de julho de 2021
A DAMA DOS VAMPIROS - NAZARETHE FONSECA
Nazarethe Fonseca, quem é? Provavelmente os leitores do meu blog nunca tenham ouvido falar nesse nome. O que ela faz e porque resolvi dedicar uma postagem à ela? Bem, Nazarethe Fonseca é uma cidadã brasileira, natural de São Luiz-MA, onde nasceu em 1973, tendo portanto 48 anos, mas reside em Natal. Temos algo em comum: livros.
É escritora, cujo ofício foi despertado aos 15 anos, mas consolidado aos 21 anos, quando criou a série "Alma e Sangue", formada por cinco livros. Nazarethe Fonseca é uma mulher que não cansa de escrever. Seus livros estão sempre voltados para a ficção sobre seres com poderes especiais, dando ênfase aos vampiros.
"O Despertar do Vampiro" vamos encontrar edições dos anos 2000, 2001, 2004, 2009).
Editora Aleph, ed. 2009 |
"O Império dos Vampiros" (2009); "Kara e Kmam"(2010), "O Pacto dos Vampiros" (2010) e "A Rainha dos Vampiros" (2011). A escritora teve a ideia de ficcionar nosso Imperador Dom Pedro I, fazendo dele um vampiro.
Seus livros estão disponíveis nas melhores livrarias do Brasil e também na loja virtual da Amazon. Tornei-me amigo da escritora e foi ela quem sugeriu que eu fizesse um blog ( quando eu nem sabia o que era isso). E justiça seja feita, ele não apenas sugeriu como criou e ensinou a fazer as postagens.
A série Alma e Sangue ganhou espaço em minha biblioteca. Vou ler todos os volumes e resenhar, pois sei que irei despertar a curiosidade de leitores que ainda não conhecem a dama dos vampiros - Nazarethe Fonseca - como escrevi acima, eu e Nazarethe Fonseca temos os livros em comum - o que nos difere é o mundo dos nossos personagens, cada escritor tem seu próprio mundo e nele habitam seus personagens.
Francisco Martins
12 de julho 2021
Nota
Foto de Nazareth - copiada do site <http://www.guardiadameianoite.com.br/2010/10/especial-de-halloween-entrevista.html>, visualizado em 12 de julho de 2021.
domingo, 4 de julho de 2021
"A IGREJA DO DIABO" NA VISÃO DE UM LEITOR CRISTÃO
Em 1884 Machado de Assis então com 45 anos publicou pela Garnier, um conjunto de contos intitulado "Histórias sem data". Nesse livro, o conto de abertura é "A Igreja do Diabo", que tem quatro capítulos. O texto trata exatamente do que declara o título - isto é - o Diabo funda uma Igreja.
O anjo decaído não nega seu caráter destruidor, "aquele que veio para destruir" tem bem ciente o seu papel: "...combater as outras religiões, e destruí-las de uma vez" (Cap.I, Parágrafo I). Há nesse conto verdades bíblicas. É bom dizer que o autor, intelectual, que provavelmente tenha sido coroinha "na Igreja de Lampadosa, na altura dos seus catorze ou quinze anos....conheceu de perto a atmosfera das Igrejas" (Massaud Moises- Coleção Vidas Ilustres - Volume Os Romancistas, ano 1961).
Quando lemos há muitas coisas que estão presentes nas entrelinhas, e com maturidade de leitor vamos notando isso ao decorrer do nosso crescimento. São as sombras das frases! O fato do Diabo se apresentar a Deus - fez-me lembrar que no livro de Jó ele também esteve diante de Deus e debalde argumentou que Jó só era fiel a Deus porque era rico e tinha uma família feliz. "Estende, porém, a mão, e toca-lhe em tudo quanto tem, e verás se não blasfema contra ti na tua face", diz o Diabo ( Jó 1:11). E é nesse livro de Jó que aprendemos ser o poder do Diabo limitado. "Eis que tudo quanto ele tem está em teu poder, somente contra ele não estendas a mão" (Jó 1:12).
Voltando ao conto "A Igreja do Diabo" vemos no final do capítulo II, no último parágrafo:"Debalde o Diabo tentou proferir alguma coisa mas Deus impusera-lhe silêncio". Notem a Onipotência de Deus mostrada por Machado de Assis neste parágrafo - Deus impusera-lhe silêncio! "Uma vez na terra, o Diabo não perdeu um minuto. Deu-se pressa em enfiar a cogula beneditina" - Aqui também nos deparamos com mais duas verdades bíblicas - presentes nas sombras das frases - são elas:
1) Apocalipse 12:12b "Ai dos que habitem na terra e no mar; porque o diabo desceu a vós, e tem grande ira, sabendo que já tem pouco tempo"
2) II Coríntios 11:14 "...Porque o próprio satanás se transfigura em anjo de luz"
Machado de Assis teve em certo tempo da sua vida, amizade com o Padre Silveira Sarmento, que lhe ensinou Latim. Isso foi em 1858 - tinha ele 19 anos. A influência do Padre Sarmento na formação do jovem Machado foi mais além do que o Latim. O fato é que sabia escrever com maestria, não apenas no estilo literário, mas também na profundidade do assunto, com domínio e conhecimento. Não podia ser diferente quem cresceu sempre nutrindo o gosto de ler.
Em 1856 - aos 17 anos - trabalhava na Tipografia Nacional - como aprendiz de tipógrafo. Um funcionário superior surpreendeu-o em falta, porque lia em pleno expediente, encaminhou-o ao administrador da repartição que era Manuel Antonio de Almeida, autor do livro "Memórias de um Sargento de Milícias". Este passou a ampará-lo e foi amigo de Machado de Assis até seus dias finais.
Chegando ao capítulo IV notamos que a Igreja do Diabo era sucesso. Estava presente nos quatro cantos da terra, mas havia O HOMEM no meio do caminho, lembrando a Pedra de Drummond que Machado não chegou a ler. E o homem - o mesmo que optou por perder o Paraíso lá no Gênesis - também agiu sendo infiel ao Diabo, mostrando "a eterna contradição humana".
Quero trazer a riqueza de elementos de intertextualidade que está presente nesse conto. São portas de diálogo que Machado de Assis deixa para o leitor abrir. Vejamos algumas: Abrãao - homem natural de Ur, região da Caldeia, do qual se originaram o Judaísmo, o Islamismo e o Cristianismo , religiões com crença em um único deus; Maomé - profeta que recebeu de Alá a inspiração para escrever o Alcorão, livro sagrado dos muçulmanos; Lutero - monge agostiniano que se tornou uma das figuras centrais da Reforma Protestante; Fausto - personagem de uma lenda popular alemã que fez pacto com o Diabo em troca da sua alma; Homero - poeta da Grécia antiga autor de Ilíada e Odisseia, além de outros.
Por fim, o que aprendemos com o conto?
Coisas assustadoras não podem ganhar ideia de normalidade
Natureza dissimulada é sempre perigosa
Quem mais compreende o homem é o seu Criador - Deus.
Francisco Martins
quarta-feira, 13 de janeiro de 2021
COMEÇA AMANHÃ EM SAGI A OFICINA DE CONTAÇÃO DE HISTORIAS
domingo, 29 de novembro de 2020
CARTA A UM RAPAZ DE CEARÁ-MIRIM
O Bacharel em Direito - Nilo Pereira |
"A Rosa Verde", livro que foi escrito por Nilo Pereira (tendo iniciado no segundo semestre de 1980 e disponibilizado para venda em julho de 1982, embora o lançamento oficial tenha ocorrido em 4 de agosto daquele ano) foi lido por Américo de Oliveira Costa, um homem que viveu sempre perto dos livros e deles conhecia a intimidade. Deixou uma biblioteca particular com 10 mil volumes. Finda a leitura do livro, Américo de Oliveira Costa escreveu a carta abaixo. Nilo estava com 72 anos, mas o leitor Américo escreveu para o jovem rapaz que estava narrando sua história em "A Rosa Verde".
"Meu caro Nilo Pereira:
Chego ao ponto final de teu livro "A Rosa Verde". Deste-lhe uma explicação: "crônica quase- romance". Parece-me, antes, um livro de memórias, o primeiro volume, talvez, de tuas memórias, pois terminas as narrações em redor dos 18 anos, já transferido para Natal, concluindo os preparatórios no Atheneu e congregado mariano. O fato de aqui e ali aludires a acontecimentos ou circunstâncias posteriores, que, juntos, te criaram um lugar ao sol, na cátedra, no livro, no jornal, na tribuna das Academias, nas assembleias, nos gabinetes de governo, não lhe altera a estrutura do tempo vivido, reencontrado e recomposto literariamente. Teu personagem Lauro, por outro lado, resulta numa máscara, num pseudônimo um tanto desajeitado, sobretudo por figurar invariavelmente, em contatos com criaturas reais, conhecidas e invocadas pelos nomes do registro civil.
Outra impressão que me provocou teu livro: já muito escreveste sobre, a propósito, em torno de Ceará Mirim. Tens admiráveis páginas sobre a cidade, o vale, os velhos engenhos, os rios, a atmosfera específica, certos estilos e maneiras do comportamento de sua gente, formados à base de civilização canavieira, com foros de aristocracia rural. "Manhã da criação", tão justamente celebrada, é uma delas. Mas (perdoe-me o radicalismo do testemunho, que não é um julgamento), dir-se-ia que tudo quanto escreveste anteriormente foram esboços, visões, experiências, resumo, (sem que pretenda diminui-los) que, ao final, se ajustaram e consolidaram em "A Rosa Verde". Ele é a suma, a soma de tua vivência de infante e adolescente, na tua e na mesma cidade de Edgar Barbosa ( ah! o caro Edgar, de tão grata memória e hoje mais uma sombra no país dos mortos), Sanderson Negreiros, Meira Pires, outros ainda, todos almas sensíveis, eternamente "rapazes de Ceará Mirim", pela alvoraçada ternura, pelo entusiasmo idílico, pelo calor humano, pela paixão sem reservas, pelos arroubos românticos, com que sempre se referem ao seu berço natal, - não importam a passagem dos anos, certos fios de cabelos brancos e os inevitáveis ceticismo e desencantos de que se tecem as jornadas do homem. A respeito, por exemplo, das glórias passadas, das ruínas das suas casas senhoriais, como a de Guaporé ou do Verde-Nasce, onde verde-nasceste, dos seus engenhos decadentes, e como expressão da permanência dos arrebatamentos daquela mocidade de espírito, - vocês não fazem por menos: evocam a Acrópole, no mínimo. Afinal de contas, é possível que tenham razão. Como diz Malraux, "uma Grécia secreta repousa nos corações de todos os homens do Ocidente". Criadores de símbolos e de imagens, cada um de nós por erguer as suas próprias Acrópoles. E como nós, cá de fora, contagiados, acabamos concordando com vocês, convictos, como no verso do poeta, de que ali "outrora retumbaram hinos". Por tais sugestões e influências, é que foi tanto mais eloquente e irretocável a carta-crônica que Sanderson te enviou há dias.
Em certos lugares e momentos, por ti evocados, os saraus no solar dos Antunes, digamos, o ambiente todo se ilumina e anima do antigo movimento, como um navio dentro da noite oceânica, os participantes revivem, ouvem-se as valsas tocadas ao piano por Paulo Lira, ido de Natal, ou Dona Darquinha, enquanto, vinda lá de fora, entra pelas varandas largas, a aragem dos espaços enluarados. Comparecem, igualmente, no teu livro, as festas da Padroeira, as festas cívicas (como a do Centenário) as festas populares (Fandangos e Nau Catarineta). Uma figura feminina passa, silenciosa e apressada, na manhã tranquila, em direção à sua escola primária: é dona Adele de Oliveira, tua professora e doce poetisa. Cruza, talvez, na rua, por acaso, (imaginamos) com outra figura feminina incorporada definitivamente à vida do vale: é Magdalena Antunes Pereira, menina ainda, que escreveria depois o livro "Oiteiro, memórias de uma sinhá-moça". Enquanto isso, os chefes locais do Partido Liberal e do Partido Conservador se empenham nas intrigas e escaramuças das campanhas políticas sucessivas...
Feliz e abençoada terra de Ceará-Mirim, que tem merecido tantos louvores, tantos cânticos, tantos devotamentos, vencendo o tempo, as ausências, as distâncias. Embora todos lá voltem, periodicamente, em peregrinações por assim dizer espirituais e telúricas.Prática em que és um irremediável reincidente, mestre Nilo.
Fizeste, na realidade, um belo livro, dentro de suas características essenciais, inclusive sob os aspectos históricos ( com reflexos nos próprios destinos da província) e sociológicos, sem esquecer o ângulo da "petite histoire", a sua face pitoresca, o lado anedótico, o limitado quotidiano de homens e de coisas do vale. Um livro agradável de ler, - e isto é, a meu ver, por sua simplicidade, a melhor qualidade de um livro. Deve-nos , entretanto, a sua continuação. Houve, um dia, tua saída de Ceará Mirim para Natal, estudar no Atheneu. E lembro aqui as palavras iniciais de Raul Pompeia no seu grande romance: "Vais conhecer o mundo", disse-me meu pai à porta do Atheneu. "Coragem para a luta". Esse tipo de coragem não te faltou. Muita água correu sob as pontes de tua vida, depois do Atheneu, cujos preparatórios concluíste em 1928, meu caro Nilo. Deves-nos, repito, a sequência das tuas navegações, começadas nas águas humildes do rio (ou córrego?) Água Azul.
Quase-romance, crônica romanceada ou memória, - o rótulo não impõe limites nem tem maior importância. O que vale e se impõe é quanto nele se contém. Até no mito da rosa verde, perdida e reencontrada miraculosamente em espaços e condições imprevisíveis e fantasiosas, impregnaste tuas páginas da misteriosa busca do sentido da vida e de algumas inconclusas insatisfações e indagações do destino do homem. Ela é o símbolo transcendental e legendário de anseios de superações terrenas, de jubilações e consolações espirituais. O homem não é uma paixão inútil, como queria Sartre que ele fosse."
Fonte: Diário de Natal, 23 de setembro 1982.
Coluna Paulo Macedo
terça-feira, 17 de novembro de 2020
PAPO CULTURA TEM TEXTO DE FRANCISCO MARTINS
Foi publicado ontem, no blog Papo Cultura, o meu segundo artigo. Dessa vez eu escrevi sobre o livro "A Biblioteca e seus habitantes" que completa 50 anos da primeira edição. Convido vocês que são leitores desta página a irem até o blog e conhecerem um pouco mais sobre o livro que é um dos clássicos da literatura do Rio Grande do Norte. Clique aqui e leia: A BIBLIOTECA E SEUS HABITANTES
quinta-feira, 29 de outubro de 2020
POESIA NÃO RIMA COM PANDEMIA - ASSERTIVAS FINAIS
Volto a escrever sobre a antologia “Poesia não rima com Pandemia”, desta vez, nesta segunda e última parte vou trazer os poetas dos seguintes estados: Amazonas, Amapá, Ceará, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rondônia, Rio Grande do Sul e a participação internacional dos poetas de Portugal e Angola.
AMAZONAS (3 poetas: Francisca dos Santos, Jailan Souza e Valdeci Duarte)
Os poetas acima, que têm como berço o estado do Amazonas, mais precisamente as cidades de Pauini (Francisca) e Boca do Acre (Jailan e Valdeci) apresentam em seus poemas um mesmo objeto material , trabalhado numa única base, a saber: a natureza humana. Francisca dos Santos mostra no poema “O homem”, o quanto ele é egocêntrico, acumulador, materialista, efêmero. Há um texto bíblico que diz: “ Pois onde estiver o teu tesouro, ali estará também o teu coração”.(Mateus 6:21).
O poeta Jailan Souza revela que em muitos corações humanos, a moeda que se faz presente é do interesse próprio. Jailan seu poema “Caverna Pandêmica” não é apenas um desabafo, é também um testemunho de que a poesia tem a sua função social. Isso me fez lembrar do poeta da sua terra, Djalma Passos (1923-1989), que certa vez escreveu:
“ Trago na garganta o gemido dos aflitos,
No peito a tortura dos injustiçados
E no olhar a mensagem dos eternamente perdidos”
Valdeci Duarte, “Crises” é um poema que transparece a flutuante índole do homem. Mas, o mesmo texto também revela que por mais forte que sejam as crises é possível encontrar soluções. Por isso, diante desses tempos sombrios ouço um dos maiores poetas da Amazônia, Thiago de Mello:
"Não importa que doa:
É tempo de avançar de mão dada
Com quem vai no mesmo rumo,
Mesmo que longe esteja
De aprender a conjugar o verbo amar"
AMAPÁ (3 poetas: Afonso Colares, Leacide Moura e Lucia Morais)
Parece até que eles combinaram, pois aqui também, os poetas do Amapá tratam da Pandemia numa tessitura poética que fazem com os textos se completem. Afonso Colares indaga em “O que é isso?” a brusca mudança que aconteceu no mundo. Leacide Moura trata no poema “Ressurreição”, sobre a vitória da vida, e Lucia Morais, quando escreveu “Tempo”, diz da igualdade que o vírus trouxe a todos nesta sociedade vitimada pela Pandemia. Sabemos que por mais esforço que faça o poeta para externar seus sentimentos, sempre ficará algo a ser dito. Álvaro da Cunha (1923 -1995), poeta amapaense, sentenciou: “O verso é apenas uma forma pálida e imprecisa”.
CEARÁ (3 poetas: Francis Gomes, Mané Beradeiro e Pedro Lucas)
Do estado do Ceará a antologia apresenta Francis Gomes, de Assaré, que participa com o poema “Assolação dos anos 20”, lembrando um pouco o cordel, mas só aparentemente na estrutura das estrofes que estão em sextilhas e na sequência das rimas (xaxaxa). O poeta Francis Gomes escreveu para um tempo futuro, na narrativa do eu lírico, os verbos estão no passado.
Em seguida o leitor vai se deparar com “O Vírus e o velho”, de Mané Beradeiro, pseudônimo de Francisco Martins, natural de Iracema. O poema é composto de versos livres, no estilo de gracejo, e trata de um diálogo entre um ancião e um médico.
Por último, Pedro Lucas, um jovem poeta de Fortaleza, com o texto “Epidemia”. Pedro Lucas ainda tem muito a aprender como poeta. Precisa burilar seus poemas, assim como a natureza faz com o carvão e o transforma em diamante.
Todos estamos sempre aprendendo, estejamos na cidade ou no campo, não foi assim que aconselhou Patativa do Assaré?
Poeta, cantô da rua
Que na cidade nasceu,
Cante a cidade que é sua,
Que eu canto o sertão que é meu”
MARANHÃO (1 poeta: Deise Torres)
Há muitos anos, o poeta Gonçalves Dias cantou a sua terra, lembrando as belezas naturais. Quem nunca ouviu esta estrofe:
“Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.”
Hoje, temos outra “Canção do Exílio”, onde saudade também se faz presente em “Meus cacos” poema de Deise Torres. A grande diferença entre um e outro é que o exílio narrado pela poeta Deise não é apenas geográfico, mas em todo o globo. Passam-se os anos e a poesia sobrevive.
MINAS GERAIS (2 poetas: Marcos Saramago e Ninfa Parreiras)
Ser mineiro e depois ser poeta é deveras uma grande responsabilidade. Marcos Saramago e Ninfa Parreiras entendem o que eu escrevo. “Dentro, fora” é assim que Marcos deu título ao seu poema. Nas entrelinhas dos versos que Marcos escreveu, eu consigo vislumbrar, o clássico de Drumonnd:
“No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.”
Pedra invisível, mortífera e fatal.
A poeta Ninfa (o nome já é poesia) escreveu “Oco do tempo”. Será que outros leitores conseguiram ver o que eu vi? O poema escrito em três cores possibilita a leitura de várias formas. Li a primeira vez como se tivesse uma só cor, depois, li apenas as palavras verdes, em seguida apenas as de cor laranja e por último, somente as pretas. Em todas as formas a poesia se faz presente.
Ser poeta em terra que nasceu Drumonnd e Adélia Prado é ter a coragem de Riobaldo.
PARAÍBA ( 1 poeta: José de Anchieta Batista)
No poema “O Bicho da China”, a morte carimba com made in China. José de Anchieta Batista escreveu todo em estrofes de 8 versos, demonstrando conhecer o uso das rimas, e as aplicou de forma harmoniosa. Como todo paraibano, não deixou de temperar seu poema com pitadas de humor.
Termina seu poema afirmando que Deus ouvirá “a dor e o grito do filho que aflito segura sua mão”. Para não deixa-lo sozinho, eis que trago esses versos de Augusto dos Anjos:
"A Esperança não murcha, ela não cansa,
Também como ela não sucumbe a Crença,
Vão-se sonhos nas asas da Descrença
Voltam sonhos nas asas da Esperança"
PERNAMBUCO (3 poetas: Evaldo Araújo, Iovani Ribeiro e João Bosco dos Santos)
Com o mote “Fique em Casa”, o poeta Evaldo Araújo construiu seu poema em décimas, usando a estrutura de rima ABCBDDEFFE, mantendo-se fiel em todas estrofes e na métrica com versos setessilábicos. Fez do poema uma tribuna que apregoa os direitos da grande massa trabalhadora.
Também em décimas, o poeta João Bosco dos Santos nos mostra sua verve poética. Aplicou a rima na estrutura ABBAACCDDC com versos decassílabos e tenta convencer o leitor de que não está falando do corona, mas de um outro vírus que acompanha o homem deste o seu surgimento.
Iovani Ribeiro viu o vírus e sua letalidade, e em versos livres (brancos), nos diz que há “Os anjos de branco”. Aos três poetas eu digo que imagino Manuel Bandeira lendo seus poemas e depois pensando: Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca da Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que eu nunca tive.
RIO DE JANEIRO (6 poetas: Adriano de Alvarenga Azevedo; Alexei Bueno; Amitrano; Bruno Black; Izzy Bey e Wendel dos Santos)
“...Toda palavra, dita ou não, é precipício. E só a poesia, precipitação”, assim diz a poeta Jéssica Iancoski (RJ), em seu poema “Precipitação”.Estamos ainda querendo nos levantar desta queda que nos deu o Coronavírus.
Precisamos do aperto de mão, tão indispensável que Adriano escreveu; da beleza “Matinada da peste”, na sinfonia canora que o eu-lírico descrito por Alexei Bueno percebeu. Enquanto o poeta Amitrano nos mostra que “O vírus da morte” sempre existiu, e o poeta Bruno pergunta qual horizonte teremos amanhã, a poeta Izzy chicoteia com palavras e com as mesmas massageia e mostra a resposta através de “Nirvana”, a libertação da alma.
“Matrix do avesso”, o poema de Wendel, que pode ser lido também de baixo para cima, fecha com otimismo a participação dos poetas do Rio de Janeiro. O certo é que tudo que vivemos até o momento e os mortos que contabilizamos (1.174.769)*, aquela rosa sobre a qual escreveu o poeta Vinicius de Morais, “A Rosa de Hiroshima”, radioativa, estúpida e inválida, que ceifou 200 mil vidas, foi apenas uma flor sem beleza no jardim da morte, que em 2020 exalou forte cheiro letal da nova rosa chamada Covid-19.
*estatística de 29 de outubro 2020
RONDÔNIA ( 1 poeta, Elizeu Melo)
Elizeu exorta que “Em tempo de pandemia” é possível refletir, ser solidário, ler, gerar oportunidades, ser criativo, ter a consciência que há deuses no Olimpo e estamos no quintal.
Deste mesmo estado, que eu considero ser o pomo de Adão (quando comparo o mapa do Brasil a um corpo), o poeta Matias Mendes (1949) autor de “Depois da Hecatombe” crê:
“Livre afinal da ambição insana,
O mundo, enfim, terá prosperidade,
Depois da extinção da espécie tirana,
Provocadora da última calamidade ...”
RIO GRANDE SO SUL (2 poetas, André Flores e Patrick Leon)
Depois de fazer este passeio poético por vários estados brasileiros, finalmente , André e Patrick conduzem-me ao extremo sul do país. Chego ao Rio Grande do Sul e ouço o “Apelo” de André, em forma de acróstico: fique em casa. Patrick, por sua vez, um gaudério com alma de seringueiro, fala verdades em “A sombra da morte”. Sim, ambos têm razão, assim como o poeta Odilon Ramos que revelou aquela lágrima:
“Era uma vez uma pequena lágrima
Ainda não chorada, nunca concebida,
Que vivia guardada, ou melhor, escondida
Num canto do olhar...”
POETAS DE PORTUGAL E ANGOLA ( Manuel Souza Fonseca (Portugal),, Miguel Manuel Zola e Zetho Cunha Gonçalves (Angola)
Com ousadia eu atravesso o Atlântico e vou a Portugal, berço do poeta Manuel Souza Fonseca, que em seu poema “É difícil” mostra sem medo a alma que possui. Acredito no que ele escreveu, e aqui, o poeta não é um fingidor, como sentenciou Fernando Pessoa, em “Autopsicografia”. E é o próprio Pessoa quem nos diz: “ ...quem tem alma não tem calma”.
No continente Africano, mais precisamente em Angola, o poeta Miguel Zola, mostra que há um novo ritmo, uma última dança, com batuque mortal. Zetho Cunha, propõe um tratamento extra convencional. Ainda bem que tudo fica na “Respiração Suspensa-5”.
A esses poetas angolanos eu pergunto: que diria Agostinho Neto (1922-1979)? Talvez ele lembrasse do poema que fala da esperança e para nós, “sentado num banco do kinaxixi às seis horas duma tarde muito quente” declamaria "Havemos de Voltar"
Parabéns a todos os participantes da antologia "Poesia não rima com Pandemia".
Francisco Martins
Parnamirim-RN, 29 de outubro de 2020