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quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

ORÍGENES LESSA E O CORDEL BRASILEIRO

Orígenes Lessa, quem é leitor facilmente vai lembrar desse nome.  Nasceu em 1903 na cidade de Lençóis Paulista (SP) e faleceu no Rio de Janeiro, em 1986,  um dia após o seu aniversário, no dia 13 de julho. Estava com  83 anos.


 Estreou na literatura em 1928 com o livro de contos "O escritor proibido", que foi muito bem recebido pela crítica.  Depois publicou outros livros e ensaios. Em 1970 ele voltou seu olhar para o público infantojuvenil para o qual escreveu mais de 40 livros. O sucesso  nessa área o tornou querido entre as crianças e os jovens do Brasil. Ele pertenceu a Academia Brasileira de Letras, onde ocupou a cadeira 10, tomando posse no dia 20 de novembro de 1981.

Orígenes Lessa  foi também  um grande colaborador no campo do cordel brasileiro.  Em 1923 ele  teve seu primeiro encontro com o cordel, quando estava visitando a cidade de Fortaleza -CE. Comprou folhetos e ficou "interessado pela seriedade dessa literatura" (palavras dele, fonte 1).  E foi graças a este interesse que ele chegou a ter um acervo com vários folhetos de cordéis. Sua cordelteca serviu de base para trabalhos de pesquisa da Casa Rui Barbosa.  E é sobre as atividades de Orígenes Lessa no campo do cordel brasileiro que eu quero escrever.

Em 1954 fez uma conferência na ABDE sobre  Literatura Popular em Versos. Esta palestra teve grande importância para a história do cordel brasileiro, pois despertou o "interesse" pelo assunto e a palestra foi citada na França, Estados Unidos e Portugal.

Orígenes Lessa, juntamente com Cavalcanti Proença e M. Diegues Jr dedicaram-se  à tarefa pioneira  da Coleção Literatura Popular em Verso, que é formada por dois Catálogos com mais 1.000 folhetos do cordel brasileiro, duas Antologias e  tomo sobre Estudos. Esses trabalhos foram publicados pelo Ministério da Educação e Cultura- Casa Rui Barbosa, nas décadas de 60 e 70.



No 1982 ainda colaborando com a Casa Rui Barbosa, fazendo pesquisa sobre o cordel, Orígenes Lessa publicou: "Inácio da Catingueira e Luís Gama: dois poetas negros contra o racismo dos mestiços"  e também escreveu um ensaio sobre "Getúlio Vargas na Literatura de Cordel" e preparou a antologia "O cordel e os desmantelos do mundo" com 25 folhetos sobre a moda.

 

 Há um livro infantojuvenil que também foca sobre o cordel brasileiro, em forma de prosa. Trata-se de "Aventuras em São Saruê", um texto que eu vou deixar para escrever sobre ele brevemente.

 Esse é Orígenes Lessa, um nome que devemos sempre lembrar e sermos agradecidos pelo seu empenho no estudo e pesquisa do cordel brasileiro. Foram poucos os intelectuais que tiveram a coragem de hastear essa bandeira naquele tempo. Por isso e muito mais meus aplausos ao escritor Orígenes Lessa.

Mané Beradeiro
Parnamirim/RN, 28 de janeiro de 2021

 

Fontes

1)  Suplemento Literário - O Estado de São Paulo - 31 de julho 1983 - página 9.

2) Fundação Casa Rui Barbosa < http://www.casaruibarbosa.gov.br/interna.php?ID_S=226&ID_M=67> Visualizada em 26 de janeiro 2021.


 

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

A DIGNIDADE, DE LONGE OU DE PERTO TEM O SABOR DE BREVIDADES


Visão, tato, paladar, olfato e audição, cinco sentidos que fazem parte do sistema sensorial humano. Coisas dadas pelo  Criador, assim como a Graça. E se principio este texto trazendo o nome daquele que nos fez é porque desejo manifestar minha gratidão a Ele em ter os cinco sentidos maravilhosamente funcionando.  Àqueles que não tem a fé, sem a qual é impossível agradar a Deus (Hebreus 11:6),  abraços-os  (fazendo uso do tato) e digo que aceito seu posicionamento, mas permitam-me lembrar uma máxima de Edgar Barbosa: “O poder de duvidar não é maior que a faculdade de crer”2


 E foi  por causa dos sentidos acima que aprendi a admirar um homem bom e um bom homem.  Com ele tenho a alegria de conviver e aprendo quando o escuto ou simplesmente quando não fala, mas se comporta com uma elegância tamanha, que também ensina. E como eu sei que há homens que não se contentam simplesmente em ter apenas os cinco sentidos funcionando harmoniosamente, este que admiro, também externou o sexto sentido que vem através da escrita, e é em seus livros que eu fui buscar deleite.


Foi em 2007 que ele publicou “A Dignidade como patrimônio”, um livro que trata sobre a biografia do seu pai Diomedes Lucas de Carvalho, embora para o autor, ele considere ser apenas “um caderno de notas puxadas da memória” (2007,p.17). Compreensível, pois o autor faz desse trabalho a sua obra de abertura no mundo da literatura e traz em si a certeza de que está entrando numa guerra de muitas batalhas, onde a arma é a palavra e já disse o poeta: 

Lutar com palavras
É a luta mais vã.
Entretanto lutamos
Mal rompe a manhã
(ANDRADE, 1979, P. 172)



É um livro cheio de registros não apenas do genitor, mas também de fatos históricos de Cuiité e outras localidades da Paraíba. O autor não mediu esforços para fortalecer suas afirmações, fazendo uso das notas de rodapé, que enriquecem mais ainda a biografia. Fico a imaginar o quanto custou e doeu ao escritor fazer este ensaio biográfico. Com certeza, a ida ao passado assegura o que escreve  Elias José: “As nossas lembranças nunca são só  nossas. Nelas estão envolvidos os nossos parentes, amigos e conhecidos”6 (2012, P.42) . Começa bem!



Li  “De Longe e de Perto”(2012) e viajei com ele, através das suas crônicas e tendo como transporte a imaginação e como combustível a narrativa  do “encabulado”, acelerei os quatro ventos e também me fiz presente em todos os lugares onde ele esteve, As crônicas  de viagens são um caleidoscópio que encantam crianças e adultos.  Entreguem um mapa mundi a este homem, uma caixa de alfinetes e peça para ele marcar os países que ainda não foi, serão poucos. 



Contar histórias é envolver,  é prender o ouvinte ou leitor da forma mais sutil e deixar que ele seja também participante da trama, vá ao texto e passeie por entre as linhas e tenha a liberdade de sentir as personagens reais ou fictícias que o autor trabalha. Em “Brevidades”(2019), a palavra escrita  vem com o sabor das memórias, enroladas em pequenas crônicas, servidas em bandejas, assim como os bolos que deram nome ao livro, nos lembra o autor.  Nota-se que a cada obra o escritor vai amadurecendo e concordo com Fraçois Silvestre, quando afirma que ele, o autor, apresenta um texto primoroso, sem ser pedante. Ler “Brevidades” não apenas me deu conhecimento sobre música, educação, sertão, cinema, etc, mas me fez pensar nas minhas memórias.


A esta altura, alguns leitores já sabem sobre quem estou escrevendo. Os que ainda não o conhecem, apresento. É Ivan Lira de Carvalho,  magistrado, professor universitário, membros de diversas associações culturais, entre elas a Academia Norte-rio-grandense de Letras,  o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte e o Conselho Estadual de Cultura do Rio Grande do Norte. Homem que enaltece sua terra, suas origens, seu berço e com muito esmero a literatura. Não canso nem minto ao escrever que ouvir ou ler é receber a sonoridade de uma lira e ter a certeza das seguras raízes de um carvalho.





Francisco Martins

13 de novembro 2019





REFERÊNCIAS:



1)      ANDRADE, Carlos Drummond de. Drummond Antologia Poética. Rio de Janeiro(RJ): Livraria José Olympio Editora, 1979

2)      BARBOSA, Edgar. Imagens do Tempo. Natal(RN): Editora Universitária, 196

3)      CARVALHO, Ivan Lira de. A dignidade como patrimônio.Natal(RN): Metropolitano, 2007

4)      __________.De Longe e de Perto. Natal(RN): Sebo Vermelho, 2012

5)      __________.Brevidades. Natal(RN): Caule de Papiro, 2019

6)      ELIAS, José. Memória, cultura e literatura: o prazer de ler e recriar o mundo. São Paulo(SP): Paulus, 2012.

sexta-feira, 5 de abril de 2019

COMENTANDO MINHAS LEITURAS: OS CABRAS DE LAMPIÃO


 Mané Beradeiro

“Os cabras de Lampião”, um poema épico do cordel brasileiro, classificado como “romance”, pois o texto supera 32 páginas. O  autor é Manoel D’Almeida Filho (1914-1995), natural de Alagoa Grande – PB, poeta que faz parte da segunda geração do cordel brasileiro (1920/1930). É sobre este texto que me debruço para escrever mais uma resenha. D’Almeida é um poeta que tem sua marca registrada na história do cordel.
 Quem desejar conhecer esta área não pode e nem deve deixá-lo à margem. É presença na “Antologia da Literatura de Cordel” (BATISTA, 1977, p. 303) e foi membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel – ABLC, sendo o primeiro ocupante da cadeira 20. Marco Haurélio não o deixou fora do capítulo: Pequeno Dicionário Biobliográfico da Literatura de Cordel  e não teme em afirmar: “Os cabras de Lampião, a obra prima  do autor é, indubitavelmente, a melhor biografia em versos sobre o famoso cangaceiro” (HAURÉLIO, 2013, p. 101).
Tomei conhecimento de um fragmento deste texto quando li “Guerreiros do Sol” (MELLO,2004, p. 315), mas somente recentemente eu pude degustar do poema em sua totalidade. A edição que li é da Editora Luzeiro, trazendo a apresentação de Nando Poeta e um texto de Aderaldo Luciano, poeta e pesquisador. Faz 54 anos que este poema foi publicado pela primeira vez, quando em 1965 saiu com o selo da  Prelúdio ( mais tarde, em 1973, passaria a ser chamada de Luzeiro).
Mergulhemos, portanto, no texto e vejamos o que nos traz “Os cabras de Lampião”.

1)          Dos Cangaceiros nomeados

“Lampião formou um grupo
Começou sua carreira,
Doze inclusive os irmãos
Era a sua cabroeira
Que passou a comandar
Sendo esta a vez primeira”
(D’Almeida Filho, 2018,p.10)

 A primeira coisa que iremos saber é que o poeta resgata neste cordel 103 nomes de cangaceiros (veja a lista abaixo), sem contar com os nomes das mulheres e aqueles que antecederam Lampião. Também não somei a esta lista os coiteiros, juízes, coronéis, padres e outras personalidades, que embora não vivessem no bando, não deixavam de ser “Cabras” de Lampião.
A maioria dos homens recebeu um nome de guerra, dado geralmente pelo próprio Lampião.
 
2)        Do espaço geográfico onde houve ataques, batalhas, sequestros e saques.

Quando entrava nos lugares
Cantava esta canção:
“O meu nome é Virgolino,
Me tratam por Lampião,
E com a revolta sou
Interventor do sertão”
(Idem, p.46)

Levei em consideração o período em que Lampião passou a liderar seu próprio grupo, que no texto é assinalado a partir da  página 10, estrofe 45 ( Lampião formou um grupo ...). As estrofes anteriores tratam da introdução e do batismo de fogo de Lampião. Virgolino Ferreira da Silva, o Rei do Cangaço, reinou de forma altaneira nos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernambuco, Alagoas e Bahia, o sertão que ele conhecia.  O poeta D’Almeida apresenta nomes de 50 localidades por onde passou Lampião e seu bando.
No tocante às cidades de Pau dos Ferros, Apodi, Areia Branca e Martins, todas no Rio Grande do Norte, mas precisamente na Mesorregião do Oeste Potiguar, aqui, o poeta D’Almeida cometeu um erro ao escrever que elas pertenciam à zona do Seridó:

Porque antes de chegar
Às portas de Mossoró,
Fez a maior bagaceira
Na zona do Seridó,
Arrasou quatro cidades
Sem de ninguém sentir dó.

Foram as seguintes cidades,
Pelos cabras saqueadas:
Pau dos Ferros e Martins,
Que se viram incendiadas,
Apodi e Areia Branca
Da mesma forma queimadas
(Idem, p.30).

O Seridó é uma região formada por 54 municípios, sendo 28 do Rio Grande do Norte e 26 da Paraíba.



O poeta D’Almeida nos mostra que, embora Lampião fosse um homem de coragem,  sempre perdeu quando a população teve tempo para se preparar e enfrentá-lo. Foi assim em Mossoró:
Pois o povo a toda pressa
Em várias ruas cavou
As trincheiras necessárias,
Depois em armas pegou,
Em defesa da cidade,
A batalha se travou
...

Sob uma chuva de balas
Recuaram novamente.
Dessa vez a retirada
Foi definitivamente,
Levando como reféns
Três pessoas na sua frente.
(Ibidem, p. 30 e 31)

E a mesma experiência de derrota aconteceu também quando Lampião e seus cabras tentaram invadir a cidade de Capela:
Num cerco muito bem feito
Lampião viu-se envolvido;
Temendo ser preso ou morto,
Conseguiu sair fugido
De Capela, com o grupo,
Completamente batido.
(Ibidem, p.42)

Ainda sobre a presença de Lampião no Rio Grande do Norte, no tocante ao sequestro do Coronel Antonio Gurgel, no texto do poema, o autor não cita o nome da localidade, mas o escritor Raimundo Nonato da Silva vai esclarecer dizendo que foi em Mato Grande, localizado entre São Sebastião (atual cidade de Dix-Sept Rosado) e Brejo, onde morava o Coronel Antonio Gurgel (SILVA, 1965, p.40)
A lista com os nomes das localidades encontra-se no final.

3)        Teria sido Lampião o pioneiro em cavar um poço de petróleo na Bahia?
Diz o cordel que durante o tempo em que Lampião e seus cabras se esconderam na vasta região do Raso da Catarina, no estado da Bahia,  certa feita ele encontrou petróleo:
                        Um dia cavando um poço,
                        Naquele seu monopólio
                        Saiu uma água suja
                        Gordurosa como um óleo
                        Que ninguém pôde beber
                        Pois podia ser petróleo
                        (Ibidem, p. 44)

O Raso da Catarina compreende 99.777ha, sendo a única reserva biológica de caatinga do mundo. Lá, a temperatura atinge 43º C e água é líquido difícil de ser encontrado. A região tem também seu misticismo. Há uma lenda sobre a fazendeira Catarina que “lutou com a seca, mas foi derrotada por uma nuvem de gafanhotos que devorou a plantação de milho e feijão, deixando-a em estado de loucura e sozinha até o fim da vida. Dizem que seu espírito vaga a localidade ajudando vaqueiros a encontrar animais perdidos”.  Também foi no Raso da Catarina que se abrigou Antonio Conselheiro.
Achei importante trazer este assunto porque há nele um diamante que precisa ser lapidado. Fui cavar no campo da pesquisa e eis que me deparo com Manoel Inácio Barros, engenheiro agrônomo, que em 1930 vivia pela Bahia tentando descobrir petróleo. Tinha até conhecimento da existência do óleo usado pelos campesinos, que utilizavam como combustível para cozinhar. O poço cavado por Lampião foi em 1931, que de forma não intencional acabou encontrando petróleo no Raso da Catarina.  Oficialmente, o primeiro poço de petróleo foi perfurado no dia 29 de julho de 1938, em Lobato-BA.
 
4)        Tentativa de conversão da moeda da época para o Real de hoje

O leitor vai se deparar com várias estrofes que trazem a nomenclatura da moeda da época.  
Do Coronel Zé Rodrigues Lampião levou seis contos (p,12). Quanto seria isso hoje? Um conto de réis equivalia a mil mirréis (R$ 123.000,00), portanto numa tentativa aproximada o Coronel Zé Rodrigues perdeu para Lampião algo em torno de R$ 738.000,00 (setecentos e trinta e oito mil reais). Deixo abaixo a tabela de conversão para que o leitor faça a atualização.

1 Réis  = R$ 0,123
1     Mirréis (Mil Réis) = R$ 123,00
1 Conto de Réis ( Mil Mirréis) = R$ 123.000,00


5)        As ilustrações

As capas das duas primeiras edições são praticamente iguais, salvo por pequenos detalhes. Afirma  Doutor Aderaldo Luciano: “Uma traz uma indicação na parte superior esquerda com os dizeres “Edição Especial” e o nome do autor em caixa maior, quase centralizado. A outra o nome do autor vem do lado esquerdo, todo em caixa alta”.

(capa da segunda edição)

Ambas as edições (1965 e 1966) tiveram o selo da Prelúdio.  A Segunda edição traz 15 ilustrações.

       A mais recente, 2018, da Editora Luzeiro, também foi ilustrada, desta vez pelo artista Walfredo de Brito, que fez 11 desenhos e a capa.
Sobre o trabalho das ilustrações é inegável afirmar que o autor (não consegui identificar) dos desenhos da segunda edição, não teve a preocupação de fazer um minucioso estudo sobre o espaço físico, geográfico e cultural  no qual se passa a narrativa.  Já na edição recente, é notória a presença de elementos da cultura, o que corrobora a certeza de que Walfredo de Brito teve a preocupação de estudar o modus vivendi das personagens.


6)        Sobre a analogia das três edições

A priori a resenha seria construída apenas com base no que li da última edição, mas quando achava que estava terminando de escrevê-la, eis que sou procurado pelo poeta e pesquisador Dr. Aderaldo Luciano, nome já bastante conhecido no meio do cordel, para que fizesse uma analogia com as edições anteriores.
O Doutor Aderaldo Luciano não pensou duas vezes e me forneceu os textos da editora Prelúdio. Aí tive que ler e reler varias vezes,  e o resultado foi o seguinte: as três edições têm a mesma quantidade de estrofes, isto é: 575, sendo 573 sextilhas, 1 sétima e 1 quintilha (que representa  uma senha dentro da fala do coiteiro Antonio de Chiquinho, p.55), assim sendo, o romance  é composto por 3.450 versos.
Na orelha esquerda da última edição, no texto que escreve o poeta e pesquisador Doutor Aderaldo Luciano, ele cita que há 653 estrofes.  Onde estariam as outras? Teria D’Almeida revisado o cordel e tirado tantas estrofes? Onde Doutor Aderaldo Luciano pegou esta informação?
A resposta que o pesquisador me deu foi que ele se baseou na ficha técnica do cordel que afirma ter 652 estrofes em sextilhas mais a estrofe final (assinatura ALMEIDA), totalizando 653.  Ele confiou na ficha técnica e a informação não bate com a quantidade real, que é de 575 estrofes.
Tive o cuidado de fazer uma leitura de forma vagarosa, sempre em conjunto de 10 estrofes   visando apurar se o texto permanece o mesmo nas três edições.  O achado foi este:
Página 16 (sempre estarei usando a última edição 2018)
 Que a um seu coiteiro traiu (edições 1 e 2)/ Que a um coiteiro traiu (edição 3).
Página 22
Até a última bala ( 1 e 2)/  Até vir a última bala (3)

Página 35
Especialmente, um médico (1 e 2)/ Um médico, especialmente (3)
Página 37
Tá’qui a moça, capitão (1 e 2)/ Eis a moça, capitão (3)
Dificilmente um cangaceiro usaria “Eis” em sua fala. Optaria sempre pela expressão coloquial “Tá’qui”.
Página 40  (a estrofe 322)
Já na estação, o trem
Chegou, saltou um soldado,
Lampião tomou-lhe as armas
E perguntou alterado:
-Macaco, se for baiano,
Agora mesmo é sangrado. 

Deixei em negrito “perguntou” porque  considero que aqui, o leitor possa achar que o poeta deveria ter usado “afirmou”, pois aparentemente Lampião está afirmando e não perguntando. Na verdade  a afirmação de Lampião contém uma pergunta indireta: queria saber se ele era baiano.
Página 41
Correram a tarde toda (1 e 2)/ Correram uma tarde toda (3)
Página 46
Agora com a revolta (1 e 2)/ E com a revolta eu sou (3)
Página 63
Suspeitou que Pedro Cândido ( 1 e 2)/ Achou que Pedro de Cândida (3)
Era o cabo João Bezerra (1 e 2)/ O tenente João Bezerra (3)
Sobre esta “promoção” de cabo para tenente  a coisa se repete nas páginas 64, 65, 67.

Página 64
Perceba o leitor que aqui houve um desfiguramento da imagem criada pelo poeta D’Almeida e que estão presentes nas edições 1 e 2. Veja:                

                   Um dos grupos dessa tropa
Ele mesmo o comandava,
Outro: o soldado Aniceto,
Em quem muito confiava,
O terceiro: um aspirante
Que Francisco se chamava

Na  edição 3 ficou assim:
                    Um dos grupos dessa tropa
                    Ele mesmo o comandava.
                    Era o sargento Aniceto,
                    Em quem muito confiava.
                    O terceiro: um aspirante
Que Francisco se chamava

Achei que não ficou bem clara a divisão, como estabeleceu o poeta nas duas primeiras edições.

 Página 67
Que se o cabo não estivesse ( 1 e 2)
Caso ele não esteja (3).

Nomes dos Cabras de Lampião

1)   Açúcar
2) Amoroso
3) Ângelo Roque
4) Antonio
5) Antonio de Engraça
6) Arvoredo
7) Asa Branca
8) Asa Negra
9) Ascilino
10)            Azulão
11)             Balão
12)            Barata-Azul
13)            Beija-Flor
14)            Besta-Fera
15)            Bom de Vera
16)            Bom-na-Tabica
17)            Cacheado
18)            Caixa de Fósforos
19)            Cajarana
20)          Cajazeira
21)            Canário
22)          Candieiro
23)          Caninana
24)          Canjica
25)          Carrapicho
26)          Catingueira
27)          Chá-Preto
28)          Chico-Peste
29)          Ciço
30)          Cobra-de-Cipó
31)            Cobra-Verde
32)          Colchete
33)          Come-Cru
34)          Cordão de Ouro
35)          Corisco (Diabo Louro)
36)          Correnteza
37)          Cravinho
38)          Cravo Roxo
39)          Criança
40)          Cruzeiro
41)            Delicado
42)          Demudado
43)          Desconhecido
44)          Deus-Te-Guie
45)          Devoção
46)          Diferente
47)          Elétrico
48)          Esperança
49)          Ezequiel (Ponto-Fino)
50)          Ferrugem
51)            Gato-Bravo
52)          Gorgulho
53)          Gorro
54)          Graúna
55)          Guri
56)          Jararaca
57)          Jitirana
58)          José Baiano
59)          Jurema
60)          Jurema
61)            Lavareda
62)          Limoeiro
63)          Livino
64)          Luis Pedro
65)          Mansidão
66)          Mariano
67)          Marreco
68)          Massiolon
69)          Medalha
70)          Meia-Noite
71)            Mergulhão
72)          Moderno
73)          Moita Brava
74)          Mormaço
75)          Mourão
76)          Nevoeiro
77)          Pai Véio
78)          Pajeú
79)          Pancada
80)          Passarinho
81)            Patori
82)          Pavão
83)          Peitica
84)          Pinga-Fogo
85)          Pinto-Cego
86)          Pó Corante
87)          Português
88)          Quixabeira
89)          Rio Branco
90)          Sabino
91)            Sabino Gomes
92)          Sabonete
93)          Santa Cruz
94)          Sexta-Feira
95)          Velocipe
96)          Ventania
97)          Vicente (Lua-Branca)
98)          Vinte e Cinco
99)          Volta-Seca
100)       Xexéu
101)        Zabelê
102)       Zé do Sapo
103)       Zepelim

Nomes das localidades citadas no cordel

1)          Alagadiço
2)        Ana-Bebé
3)        Angico (onde Lampião morreu)
4)        Apodi
5)        Aquidabã
6)        Areia Branca
7)        Belmonte
8)        Bom Nome
9)        Buíque
10)     Cabrobó
11)      Caminho do Juazeiro do Norte – confronto com a Coluna Prestes
12)     Caminho entre Mossoró e Limoeiro do Norte ( assaltou vários fazendeiros)
13)     Caminho perto de Mossoró – onde sequestrou o Coronel Antonio Gurgel.
14)     Capela
15)     Casa do Coronel Antonio Gurgel ( perto de Mossoró)
16)     Fazenda das Abóboras
17)     Fazenda de Clementino Furtado
18)     Fazenda de Olho D’Agua
19)     Fazenda em Sergipe (não identificada)
20)   Fazenda Melancia
21)     Fazenda Touro
22)   Fazendas de Limoeiro do Norte
23)   Flores
24)   Floresta dos Navios
25)   Gangorra
26)   Gavito
27)   Itapicuru
28)   Jeremoabo
29)   Leopoldina
30)   Martins
31)     Matinha de Água Branca – AL
32)   Mossoró
33)   Pau dos Ferros
34)   Pinhão
35)   Serra de Baixa Verde (onde Lampião é ferido pela primeira vez numa batalha)
36)   Serra do Araripe (Lampião é atingido no peito durante um tiroteio)
37)   Serrinha
38)   Serrote Preto
39)   Sousa
40)   Trecho entre Flores e São João dos Leites
41)     Triunfo
42)   Várzea da Ema
43)   Vila Algodões
44)   Vila da Taboca
45)   Vila da Tapera
46)   Vila de Arrasta-Pé
47)   Vila de Custódia
48)   Vila do Espírito Santo (3x)
49)   Vila do interior de Sergipe (não identificada)
50) ila Malhada da Caiçara (Distrito de Santa Brígida)

Agradeço aos colaboradores Doutor Aderaldo Luciano, Nando do Cordel e Gilberto Cardoso e por fim finalizo a resenha plagiando uma estrofe do autor:

                     Tudo que aqui narrei
                    Dos cabras de Lampião,
                    Li e fiz releitura
                    Pensando no meu sertão.
                    Não tenho culpa se houve
                    Erros na informação.

Parnamirim-RN, 10 a 19 de março 2019

Referências

1)          BATISTA, Sebastião Nunes. Antologia da Literatura de Cordel. Natal: Fundação José Augusto, 1977.
2)        CASCUDO, Luís da Câmara. Nomes da Terra. Natal: Fundação José Augusto, 1968.
3)        D’ALMEIDA FILHO, Manoel.  Os cabras de Lampião. São Paulo: Editora Luzeiro, 2018.
4)        MELLO, Frederico Pernambucano de. Guerreiros do Sol – Violência e banditismo no Nordeste do Brasil. São Paulo: A Girafa, 2004.
5)        HAURÉLIO, Marco. Literatura de Cordel – do sertão à sala de aula. São Paulo: Paulus, 2013.
6)        SILVA, Raimundo Nonato da. Lampião em Mossoró.  Rio de Janeiro: Editora Pongetti, Coleção Mossoroense – Série C – Volume XVI – 3ª edição, 1965.