Muita coisa boa foi dita sobre Ceará Mirim referente ao tempo passado. Escreveram sobre fatos e pessoas. Artigos que nos fizeram reviver épocas maravilhosas. Darei também minha contribuição aos 150 anos desta cidade, mas o que escrevi fui buscar num tempo que está muito mais aquém do ano de 1858.
Convido os leitores a formularem comigo, em suas mentes, a imagem destas terras, no século XVI. Sei que será difícil, mas vamos tentar. Não existia nenhuma cidade, nenhuma estrada. Os caminhos eram totalmente veredas, e nelas caminhavam índios, portugueses, holandeses.
Entre estes índios, havia um que batizado à fé católica, recebeu o nome de Antônio Paraupaba. Grave bem este nome. Filho de Antônio Gaspar Paraupaba, da tribo Potiguara, que vivia nestas terras onde hoje é Ceará Mirim, o índio tornou-se amigo dos holandeses e fez história.
Aprendeu a ler e escrever, destacando-se entre os principais mediadores entre holandeses e índios no Brasil. Em 1625 atravessou o Atlântico, juntamente com seu pai e outros onze indígenas rumo a Holanda.
Foi designado por Maurício de Nassau, Governador Geral, para acompanhar juntamente com ele uma delegação brasiliana, na Holanda, onde participou de uma audiência com os senhores dirigentes da Companhia das Índias Ocidentais. E para eles falou na língua flamenga.
Antônio Paraupaba garantiu com sua luta a liberdade dos índios e assegurou alguns privilégios para os brasilianos, incluindo o estabelecimento de câmaras de escabinos (vereadores) nas aldeias e a criação do cargo de regedor.
Foi destaque na mobilização de guerreiros indígenas durante a “Guerra dos Bárbaros” também conhecida como “Guerra de Açu”, que durou mais de cinquenta anos.
Diversas vezes viajou para os Países Baixos, mas em 1654 foi pela última vez para a Holanda, quando redigiu dois memoriais para os Estados Gerais. Desta forma, Antônio Paraupaba, índio, é sem sombra de dúvida, na pré-história da cidade de Ceará Mirim, o nosso primeiro escritor, e o que é melhor, com obras publicadas na Holanda.
Faleceu em 1656 sem ter recebidos respostas às suas reivindicações. Seus manuscritos foram publicados em forma de panfletos pela Editora Hondius, em Haia, Holanda.
Hoje, Paraupaba é nome de um grupo de estudos da questão indígena no Rio Grande do Norte, criado em 2005, formado por professores, pesquisadores e estudantes da UFRN (Museu Câmara Cascudo e Departamento de Antropologia).
Eis aí então um nome que Ceará Mirim deve não esquecer: Antônio Paraupaba. Onde morou? Onde ficava sua aldeia? Que mais poderemos saber dele? São perguntas que talvez não recebam respostas, mas diante da infância de 150 anos de uma cidade, é motivo de alegria saber que um filho genuíno desta terra fez tanto pelo seu povo.
Francisco Martins
Nota: texto originalmente publicado na página da ACLA, disponivel em: https://www.facebook.com/profile.php?id=100008452352746. Visualizada em 29 novembro 2017.