Professor Ismael André
Cheguei disposto a ensinar a construir crônicas, material todo pronto, esquematização do plano de aula estava perfeito nas minhas correntes cerebrais, que fizera durante toda madrugada no repouso da escuridão.
Inicio a minha aula, faço as
considerações iniciais, e já estava adentrando ao conteúdo, quando fui
interrogado:
- Mas professor, o que é crônica?
Tentei ser menos técnico do que
de costume e disse que crônica era uma narrativa histórica que expõe os fatos do cotidiano
seguindo uma ordem cronológica. Exemplifiquei que as mesmas são frequentes em
jornais e revistas periódicas.
-
Relaciono a crônica com a notícia. A notícia é o registro técnico do fato, a
crônica, por sua vez, é a notícia idealizada numa linguagem poética, literária.
O cronista é um literata que pode ser jornalista...
-
Ah, professor, então minha vó é cronista!!!
-
Ela faz crônica, Samuel? – fiz a pergunta num tom tão curioso.
-
Ora se não faz!!! Ela é brilhante nisso...
-
Tem textos publicados? – a euforia do amar escrever me deixava mais
entusiasmado em conhecer uma conterrânea da minha modesta cidade. Afinal, nunca
fui conhecedor que alguém naquela cidadezinha tivesse se destacado na
literatura.
-
Nada, professor!!! Minha vó nem sabe ler, que dirá escrever!!! O cronista não
pode usar somente da fala?
-
Na verdade, pode sim. Mas, o ideal é que se registre na escrita. Mas, por que
você diz que sua vó é cronista, menino?
-
Porque toda tarde, professor, ela senta na calçada, no que o senhor chama aqui
de mesa redonda, mas não tem mesa... rsrsrs... com um grupo de amigas... e
relata numa precisão tão grande, que até me admiro todos os fatos ocorridos na
cidade... E são em ordem cronológica, narrados numa linguagem bem coloquial, em
narrativas curtas...
-
Sério?
-
Sério! Ela comenta: Oh Comadre Maria, você viu que a menina do José passou na direção
da rua do Hospital já era umas dez da noite e logo depois o filho da Alzira
vinha de lá? Oh Comadre Joana, você viu que foi só o esposo de Antonieta sair e
o vizinho passou para lá? Mas, Comadre Zefa, era umas quatro da manhã quando um
carro rondava a praça, o que será que queria, será que vão assaltar o banco
daqui?
E
continuava a descrever a fala da avó, até que o interrompi:
-
Samuel, sua vó sabe de tudo isso?
-
E muito mais, professor!!! Inclusive hoje, ela me disse que o senhor deixou a
namorada em casa por volta de umas dez da noite de ontem e logo depois parou na
praça e dizia ao celular: quando eu chegar em casa, eu resolvo seu problema,
esquematizo tudo para amanhã e ponho nas suas mãos, porque só gosto de fazer
isso de madrugada, na calmaria da noite.
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