1
fevereiro 2019 : A Ira de Judas é o título de um livro de Ana Claudia Trigueiro,
que tem onze contos. Foi publicado pela CJA, a capa é de Heverton R e a revisão
de Bárbara Parente. A autora abre o livro com um poema de Zila Mamede, que a
meu ver é um aviso sobre o que o leitor vai encontrar nas próximas páginas.
Deixei-me
renascer no silêncio das horas e fui ler os contos assombrados. Na sua forma tão
peculiar de escrever Ana Cláudia Trigueiro me colocou frente a frente com um
terrível tubarão; revelou quem foi a pessoa que encontrou o tesouro do pirata
Jacques Riffaut, lá no Poço do Dentão e me fez vibrar com o plano de Simon.
Até
aí eu percebi que o livro exigia de mim, quanto leitor, um comportamento
diferente, deveria degusta-lo como os bons vinhos, sem pressa. Deixei-o em
minha escrivaninha e fui dormir pensando nas imagens daqueles contos.
2
fevereiro 2019: Retorno à leitura e eis-me debruçado sobre o conto metafórico
de um mártir da Revolução de 1817 no Rio Grande do Norte. Na sequência, “o
tempo escorrega bruscamente”, ouço latidos da minha cachorra no quintal, a meiga
Ing. Quando dou conta de mim já estou dentro do texto, ladeado por Januária e Tonho.
Por que eu fui entrar no conto? Não bastava ter ficado como simples leitor?
Sofri, corri, gritei dentro mim ( para não acordar Sandra). Fui salvo porque me
lembrei que não havia tomado a dupla “Lo e Sin” (Losartana e Sinvastatina). Teria eu ainda coragem para sair da Serra
Corada e ir à página 72? Ing latiu e eu fui dormir.
3
fevereiro 2019: Esta é a terceira noite de leitura, percebo que o Daniel deste
conto talvez tivesse tido mais sorte se
estivesse na cova dos leões, do que indo para casa em ruas tão desertas. Estou
ávido pelo desfecho ... Já li e não vou revelar. O conto sobre Abelin não é assombroso, é
romântico. Estamos precisando de
espíritos como o de Plácida para cuidar das nossas memórias. Lembrei-me do
túmulo de Nísia Floresta, invadido em sua área, desrespeitados os limites.
4
fevereiro 2019: Estou de plantão e tenho
tempo para ler. Daqui, bem próximo do morro de Mãe Luiza ouço tiros. Natal está
muito violenta. Ana Cláudia Trigueiro me
oferece como abertura para minha leitura “O estranho cemitério do Serrote do
Junco”. Destaco a frase “ a dor de uma
mãe que perdeu um filho lateja até seu último dia de vida”. Quanta desordem aconteceria no mundo se realmente
os mortos ressuscitassem daquela forma. Quem ainda não teve aquela sensação do já
visto, já vivido (déjà-vus)? Eu mesmo tive várias, é algo transcendental, uma
experiência como a de Erina. Vejo que
faltam poucas páginas para concluir o livro. Opto para continuar amanhã.
5
fevereiro 2019: Cada vez mais eu confio
no livro dos livros, lá eu aprendi que não há nada novo debaixo do céu. Ao
iniciar a leitura do penúltimo conto de hoje tenho a nítida sensação que a
escritora Ana Claudia Trigueiro ouviu muitas das histórias que eu também
escutei quando era criança. Pacto com o demônio é um mote sempre constante nas histórias de “Trancoso”. O que gostei
neste conto é que a autora apresenta o
diabo como um homem bem vestido, cheiroso, barbeado. Nada de chifres, rabo e
catinga de enxofre. Recordo-me da
citação bíblica: “ ...Porque o próprio Satanás se transfigura em anjo de luz”
(2 Coríntios 11:14). Satanás não rir,
segundo a tradição judaica e cristã, mas no conto ele sorrir. São coisas
possíveis à literatura. Começo o último conto. Um monstro chamado Labatut,
reside num lajedo. Quando um dia eu for conhecer o tão lajedo terei muito
cuidado para não me deparar com Labatut, afinal eu tenho gorduras espalhadas
pelo corpo, e isso poderá despertar o apetite
do ogro.
E assim terminei a leitura do livro
A Ira de Judas. Viver é maravilhoso,
mas viver lendo é melhor ainda.
Francisco
Martins
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