No século 17 a região era conhecida como Rifóles, referência ao pirata francês Jacques Riffault, que frequentava o ‘cais do sertão’ em busca de pau brasil.
Não conta ainda cem anos de existência. Em abril de 1856, quando o Cemitério foi inaugurado, o Presidente Antonio Bernardo de Passos informava ter adquirido um carro fúnebre em razão da “grande distância entre o Cemitério e esta Cidade”.
O Alecrim ficava no fim do Mundo…
A Praça Pedro II teve o privilégio das primeiras filas de casas. Conta-se que ali morava uma senhora (Ana Alecrim) que costumava enfeitar com ramos de alecrim os caixões dos “anjinhos” enterrados no cemitério, daí a origem do topônimo. Outra versão fala da abundância de alecrim-do-campo nesta área.
O bairro começava no Baldo, um reservatório das águas que desciam do Barro Vermelho, pela mata da Passagem. Daí, prosseguiam para o Oitizeiro, por dentro da Usina Elétrica, dirigida pelo mecânico alemão Johann Bragard, situada defronte da Santa Cruz da Bica. Poucas ruas e casas. Mais adiante, largas avenidas numeradas, repletas de mata-pasto e se prolongando, quase desabitadas, em direção ao Tirol.
Em outubro de 1871, o Presidente Delfino informava que a única desvantagem da Fonte Pública (Bica), no Baldo, “era ficar no último ponto do bairro alto da Cidade”.
Em dezembro de 1878, o Vice-Presidente Manuel Januário Bezerra Montenegro aludia ao Cemitério, “situado à grande distância da Cidade”.
Raríssimas pessoas residiam naquele descampado. Era terra de roçados de mandioca e milho, zona de caçada para os Morros. Umas quatro casinhas, de taipa, cobertas de palha, sem reboco, denominadas “capuabas”, estavam dispersas num âmbito de légua quadrada.
Segundo o historiador Luís da Câmara Cascudo, o antigo bairro do Alecrim era um local descampado, terra de roçados de mandioca e milho. Existiam umas quatro casinhas de taipa, cobertas de palha e sem reboco, denominadas capuabas, estavam distantes cerca de uma légua quadrada.
O Alecrim já foi chamado de Refoles, Alto da Santa Cruz e Cais do Sertão. Um dos marcos da ocupação das terras que originaram o bairro Alecrim foi a inauguração do Cemitério Público, em 1856, pelo Presidente da Província, Antônio Bernardo de Passos por causa de uma epidemia da cólera que aumentou a mortalidade geral da cidade.
Quando, a 7 de setembro de 1882, o Presidente Francisco de Gouveia Cunha Barreto pôs a primeira pedra para o “Lazareto da Piedade” (Asilo dos Alienados), o Alecrim era uma capoeira, entrecortada de tufos verdes de vegetação. Dizia-se que por ali passava a “estrada velha de Guararapes”. Nada mais.
Nos primeiros anos da República, o negro Manuel Lourenço possuiu o sítio mais distanciado, “Mangueira”, hoje Praça Gentil Ferreira.
Seguia-se o “Alto da Bandeira”, tendo essa denominação porque o industrial Amaro Barreto, abrindo a estrada de Macaíba para Natal, ali fincou uma alta e grande bandeira para orientar os trabalhadores. Ficou o topônimo: – “Alto da Bandeira” no cruzamento da Rua Fonseca e Silva com a Av. Presidente Quaresma, num comoro.
Aí se levantava, assombrando os tardios transeuntes, a “Cruz do Amaro”, recordando o assassinato de Amaro Xavier do Nascimento, em 1894.
Outro ponto de concentração demográfica era a “Baixa da Égua”, que o Vigário João Maria mudou para “Baixa da Beleza” e onde se construiu a capela de S. Sebastião.
Em 1905, na epidemia de varíola, o Alecrim estava densamente povoado, campo da inesgotável caridade do Padre João Maria. Ao redor da Praça Pedro II, as casinhas se aprumavam.
Mesmo assim, de Natal até o Baldo (Praça Carlos Gomes), havia caminho limpo. Para cima era uma trilha serpeando no meio do mato.
Apesar desse progresso, ainda em 1910 caçavam veados e cotias na Av. Alexandrino de Alencar.
Oficialmente o bairro foi fundado em somente em 23 de outubro de 1911, mas registros apontam atividades urbanas anteriores. Com dois padroeiros, São Pedro (o oficial) e São Sebastião, o Alecrim também se caracteriza por sua religiosidade, onde várias religiões convivem lado a lado – católicos, evangélicos, espíritas e suas vertentes.
Em 1912 a Escola de Aprendizes Marinheiros ficou no Refoles, articulando-se com os centros do Alecrim pela Rua Silvio Pelico. Em 1914, o Governador Ferreira Chaves fala na “grande distância para Natal”. A 15 de agosto de 1919, Alecrim é freguesia com sede na Igreja de S. Pedro.
Com o tempo, foram chegando aos prédios a luz elétrica e a água encanada. A linha de bondes demorou um pouco. Candeeiros e lamparinas iluminavam as casas. Quem não tinha poço ou cacimba no quintal tratava de obter água em chafarizes públicos, junto aos poucos cata-ventos. Lá para o quilômetro seis dos trilhos da Great Western funcionavam, em prédios adaptados, o Isolamento de São João de Deus, para tuberculosos e o Isolamento de São Roque, para variolosos. A pequena igreja de São Pedro, na praça Pedro Américo (hoje Pedro II), foi alargada e elevada após a criação da Freguesia, em 1919. O padre alemão Fernando Noite, da Ordem da Sagrada Família, vigário local, promoveu até mutirão, nas tardes de domingo, quando, para as obras, muitas pessoas, inclusive meninos, iam buscar tijolos e telhas junto à linha férrea e subiam pela rua Sílvio Pélico.
O perfil do bairro começou a ser delineado a partir da administração do Prefeito Omar O’Grady, que, em 1929, convidou o arquiteto italiano Giacomo Palumbo, para traçar o Plano de Sistematização para expansão urbana da cidade. Conta-se que Palumbo, sob a influência da cultura americana, desenhou um traçado com avenidas e ruas largas, as quais registravam com números. Da Avenida 1 até a Avenida 12, houve a associação da numeração com o nome de personagens históricos, intercalados com nomes de tribos.
A tradicional feira do Alecrim foi criada informalmente por José Francisco, natural da Paraíba e morador de São José do Mipibu ainda na década de 20. No início, a feira funcionava aos domingos embaixo de uma mangueira na atual avenida Amaro Barreto. No dia 23 de março de 1957 Câmara Cascudo apresentou José Francisco como o idealizador da feira, mas só no ano seguinte a Câmara Municipal de Natal aprovou a Lei para o funcionamento da feira e uma placa de bronze foi fixada na rua Nove.
Em 1941, durante a II Guerra Mundial, com a instalação da Base Naval, o bairro teve acelerado o seu processo de urbanização, quando se registra um aumento da população com a vinda de pessoas do sertão, e de outras regiões, para negócios na capital.
“O bairro do Alecrim, com todos os elementos sociais que caracterizam uma Cidade, já se espalha e derrama sua população em quilômetros e quilômetros, num avanço tentacular e dominador.
Há quem viva seis meses sem vir a Natal porque o Alecrim é bastante para a ressonância de interesses comerciais e domésticos”.
Cita Luís da Câmara Cascudo em artigo publicado originalmente – A República, Sábado, 10 de outubro de 1942.
Oficializado como bairro pela Lei Nº. 251, de 30 de setembro de 1947, na administração do Prefeito Sylvio Piza Pedroza, teve seus limites redefinidos pela Lei nº. 4.330, de 05 de abril de 1993, oficializada quando da sua publicação no Diário Oficial do Estado em 07 de setembro de 1994.
A vida cultural do Alecrim registra a existência de cinemas, até a década de 80, que, gradativamente, foram fechados: o São Luiz, o São Pedro, o São Sebastião, o Paroquial e o Olde. Nos carnavais, a cidade se voltava para ver os desfiles dos corsos (carros alegóricos dos carnavais do passado) que se realizavam nas ruas Sílvio Pélico, Amaro Barreto e adjacências.
O bairro teve, em sua história, como um dos principais pontos de encontro o bar Quitandinha na Praça Gentil Ferreira, local de “bate papo”, onde boêmios varavam as madrugadas, desde a época da II Guerra Mundial.
Em 1966, o Rotary Club do Alecrim deu de presente a praça um relógio. O Rotary tinha como objetivo prestar um serviço a população, que na época não tinha condições de comprar um relógio. O relógio do Alecrim é referência para 92% das pessoas que passam pelo local.Em 2011, após 45 anos de uso, o Rotary Club do Alecrim trocou o relógio antigo por um novo, em comemoração ao centenário o bairro do Alecrim.
O bairro ainda tem como marca registrada o comércio de produtos populares, com sapatarias, lojas de tecidos, produtos agrícolas e as barbearias, que resistem ao tempo. Há bares e esquinas com jogo do bicho, uma tradição do lugar. Na década de 80, a construção do camelódromo (tentativa de resolver o problema gerado pelo conflito entre ambulantes e comerciantes estabelecidos) marcou a vida do lugar. Erguido em trecho da Rua Presidente Bandeira, aglutina vendedores ambulantes que comercializam produtos diversificados.
E os principais habitantes do bairro, na época?
No Barro Vermelho, constituído de sítios de muitas fruteiras, alguns com água corrente, pássaros cantando por toda parte, locais privilegiados para os melhores piqueniques e festas juninas, residiam o juiz federal Meira e Sá, o tenente João Bandeira de Melo, do Batalhão de Segurança; o comerciante Joaquim das – Virgens Pereira; o guarda-mor da Alfândega Carlos Policarpo de Melo, o escriturário do Tesouro Estadual João Fernandes de Campos Café, também pastor protestante; a família Melo, de Augusto Severo, e outros.
Na atual Praça Pedro II, do lado direito: Os comerciantes Alfredo Manso Maciel; José Antônio Fernandes e Isidro José da Rocha, os proprietários Elpídio Estelita Manso Maciel (Esteio Manso) e Pedro Joaquim Lins; os funcionários federais José Augusto da Fonseca e Silva e José Ildefonso de Oliveira Azevedo; o fiscal da Inspetoria Geral de Higiene (Secretaria de Saúde Pública) Antônio Cavalcanti de Albuquerque Maranhão (Cavalcanti Grande); do lado esquerdo: Os comerciantes Clínio e Teódulo Sena e Francisco Antônio Fernandes; o capitão Joaquim Andrade de Araújo, do Batalhão de Segurança; o pistonista José Alves de Melo, o sacristão Francisco Antônio do Nascimento, depois oficial comissionado do Exército (tenente Chico); o tenente João Alexandre de Vasconcelos (Joca de Xandu), que combateu em Canudos; o desembargador Hemetério Fernandes Raposo de Melo, cuja casa foi ocupada em seguida pelo fiscal de consumo José Ribeiro de Paiva.
Na rua Boa Vista, no centro da qual havia enorme barreiro: O tenente Inácio Gonçalves Vale, do Batalhão de Segurança e o comerciante João Andrade. Na rua General Fonseca e Silva: O oficial de justiça Abílio César Cavalcanti, depois delegado auxiliar da Capital e juiz de direito no interior, e o administrador do Hospício, Cândido Henrique de Medeiros, que fundou, em 19 de julho de 1914, a Conferência de São Pedro, dos vicentinos e a presidiu até quase o fim da vida. Cândido Medeiros (Seu Candinho), à frente dos confrades, prestou grandes serviços à pobreza do Alecrim e lecionou à noite, por algum tempo e sem remuneração, num dos salões do Grupo, tendo constituído, talvez, o primeiro curso, no Estado, de alfabetização de adultos. Em sua residência, seu filho Lauro, com alguns rapazes do bairro, fundou em 1917 e presidiu o Alecrim Futebol Clube. Os times treinavam e jogavam, inicialmente, num campo improvisado, em local para novo cemitério, nas proximidades da capelinha de São Sebastião, na Baixa da Beleza (rua Coronel Estêvão). O goleiro do quadro principal era o estudante João Café Filho, futuro Presidente da República.
Na rua América: João Antônio Moreira, carteiro dos Correios, que organizava e ensaiava, no quintal, anualmente, para o Carnaval, o Bloco Alecrinense, que todos chamavam A Maxixeira porque seus foliões desfilavam como verdureiras; Faustino de Vasconcelos Gama, administrador do Cemitério, que, nas festas natalinas, costumava mandar exibir, defronte da morada, para o público em geral, o Bumba-meu-Boi e os Congos, já que Pastoril ou Lapinha, Boi de Bonecas e João Redondo eram apresentados dentro de sítios ou salas.
Na rua Borborema: Os irmãos José e Francisco Martins Pinheiro, funcionários do Tesouro Estadual; os comerciantes Vicente Barbosa, João Luiz de França, Bento Manso Maciel, Luiz Rogério de Carvalho e Genuíno de Sousa Menino; o líder João José da Silva(João Ponche), da Liga Artístico-Operária, da Cidade Alta e o sargento-enfermeiro da Marinha Serôa da Mota, que realizava na residência sessões do Espiritismo.
Na rua Amaro Barreto: Os comerciantes Antônio Jeremias de Araújo e Manoel Firmino e o tabelião Miguel Leandro, que ensaiava em seu sítio o melhor Fandango natalense e o levava, nas festas de fim de ano, com a Nau Catarineta, a um grande tablado, na atual praça Gentil Ferreira. Cosme Ferreira Nobre, oficial de justiça do Tribunal, instalou nessa rua uma assembleia dos Pentecostistas. Havia por ali, pontos do chamado Jogo do Bicho, que em Natal não era tido como contravenção penal.
Na rua Coronel Estêvão, a mais extensa: O desembargador Antônio Soares de Araújo, então juiz de direito da Capital, que, à falta de médico no bairro, forneceu todas as manhãs, à sua custa e gratuitamente, durante anos. Doses de homeopatia aos doentes sem recursos, que o procuravam; o cônego Estêvão José Dantas, professor do Atheneu Norte-Rio-Grandense, que cooperava também nos atos religiosos da Paróquia; o guarda-livros Manoel Pinto Meireles, os poetas Damasceno Bezerra e Manoel dos Santos Filho; o capitão Felizardo Toscano de Brito (que voltaria a morar no Alecrim quando general da Reserva), Mário Eugênio Lira e José de Vasconcelos Chaves, secretário e tesoureiro da Prefeitura; a viúva Adelaide Fonseca (os quatro últimos na faixa conhecida como Alto da Bandeira); os comerciantes Manoel dos Santos Morais, Francisco Gorgônio da Nóbrega, Francisco das Chagas Dantas (Seu Chaguinhas) e Antônio Ferreira da Silva (Tota de Chicó), os três últimos os organizadores da Feira do Alecrim.
Na Avenida Alexandrino de Alencar: O coronel Manoel Lins Caldas, ex-comandante do Batalhão de Segurança (hoje Polícia Militar); o professor José Elídio Carneiro, da Marinha; o comerciante Sandoval Capistrano e o tesoureiro do Correio Geral, Pedro da Fonseca e Silva, o qual exercia também a função gratuita de delegado de polícia do bairro. Ali, ficava também o Posto Policial.
Na Rua Sílvio Pélico: O funcionário da Alfândega Antônio de Araújo Costa. Em casa próxima à Escola de Aprendizes Marinheiros, morava o comandante Antônio Afonso Monteiro Chaves, que matriculava os filhos no Grupo Escolar, o mesmo fazendo os que serviam naquele estabelecimento militar. Os pequenos cariocas, uns mais adiantados e esclarecidos, eram escutados com grande curiosidade pelos coleguinhas do bairro, sobre coisas do Rio de Janeiro. As noites eram tão tranquilas que, muitas vezes, se conseguia ouvir, das imediações do Grupo, o toque de silêncio, das vinte e duas horas, do clarim do Esquadrão de Cavalaria, no Tirol (avenida Hermes da Fonseca). Esse o Alecrim dos dez primeiros anos de sua criação, o bairro que o professor Luiz Soares, educando gerações, viu diariamente, durante mais de meio século, crescer e progredir.
Naquele tempo, o passeio-escolar mensal, para que os alunos aprendessem melhor a amar a Natureza, era vez por outra dirigido pela avenida Alexandrino rumo à Lagoa do Enforcado ou à Lagoa Seca. Um dia muito alegre para mestres e discípulos. O próprio diretor do Grupo organizava, com especial carinho, anualmente, duas comemorações — a Festa da Árvore e a Festa das Aves. Diversos alunos, na véspera, munidos de gaiolas e alçapões, percorriam sítios do Barro Vermelho e as matas do Réfoles, a fim de apanharem passarinhos, os quais eram soltos, alegremente, na manhã seguinte, quando as alunas, sob a regência de Carolina Wanderley, entoavam o Hino às Aves. A pobreza dominava os alunos. Não conheciam Papai Noel. Nem havia a merenda-escolar do governo. O pequeno horário de recreio, nas áreas internas, tinha a supervisão benéfica dos inspetores de alunos, Laurentino Ferreira de Morais (que faleceu como coronel da Polícia Militar) e Maria Elisa Pinto Meireles. Também não se adotava, em estabelecimento primário, a prática organizada de esportes. Muitos aprenderam a nadar fugindo de casa, à tarde, a fim de se banharem na maré, no Réfoles. Outros, se iniciaram no futebol na via pública, com bolas-de-meia, ou então adquirindo, em clubes, bolas de couro já imprestáveis, que enchiam com bexigas de boi obtidas na Matança (Matadouro Público), situado junto à grande curva da via férrea, no Oitizeiro. Aqui e ali, com muita dedicação, o diretor e as professoras conseguiam uma ou outra diversão gratuita para os discípulos.
O grande ideal do professor Luiz Soares foi sempre ver o Escotismo difundido, com eficiência, por todo o território nacional, por lhe parecer a melhor escola de preparação moral e cívica infanto-juvenil. Foi também o que procurou demonstrar, no Catete, em 1922, quando recebido em audiência pelo Presidente Epitácio Pessoa.
De início, participou com Henrique Castriciano e Monteiro Chaves, em 1917, da fundação da Associação Brasileira de Escoteiros do Rio Grande do Norte. Levou para ela cerca de trinta alunos de seu Grupo Escolar. A entidade nem chegou a completar dois anos de funcionamento. Por isso, ele fundou, em 14 de julho de 1919, a Associação de Escoteiros do Alecrim, hoje incorporada à Regional de Escoteiros.
Havia um antigo chalé, coberto de zinco, na atual praça Pedro II, esquina da rua Soledade, utilizado para fábrica de redes e, em seguida, para cinema, no qual atuava, como pianista , o futuro maestro Waldemar de Almeida. Pois ali nasceu a Associação, naquela radiosa manhã de 1919. Setenta e cinco escoteiros, quase todos alunos do Grupo Escolar, desfilaram pelas ruas do bairro e participaram da missa campal, na Igreja de São Pedro, comemorativa da assinatura do Armistício, após a Primeira Guerra Mundial.
O professor Luiz Soares obteve do governo Ferreira Chaves a construção dos salões do Grupo que ficam do lado da rua Coronel Estêvão e o instrumental para uma banda de música de dezesseis figuras, regida por José Gabriel Gomes da Silva (pistonista), funcionário dos Correios e pelo sargento Manoel Florentino de Albuquerque (clarinetista), depois guarda-fiscal do Tesouro. As aulas teóricas de Música começaram em 2 de maio de 1918 e já em 15 de outubro essa banda escolar (a Charanga do Alecrim) estreava fazendo alvorada pelo natalício do Governador, na residência oficial deste, à praça Pedro Velho.
Do governo Antônio de Sousa, conseguiu a criação, em 1920, do Curso Complementar, noturno, inclusive para adultos, sendo designado, no começo, para a cadeira de Geografia e História do Brasil. As outras ficaram regidas pelos professores Israel Nazareno de Souza (Português), Francisco Ivo Cavalcanti (Aritmética) e Anísio Soares de Macedo (Francês). Funcionou também no Grupo, naquele governo, uma Escola Profissional. Obteve, igualmente, que, no Frei Miguelinho, a quinta-feira fosse considerada Dia do Escoteiro, terminando as aulas ao meio-dia. O pavilhão nacional era hasteado no início, com execução, pela Charanga, do Hino à Bandeira, cantado pelas alunas. As áreas e salões do Grupo eram ocupadas, à tarde, pelos exercícios dos escoteiros, os quais desfilavam, em seguida, pela via pública precedidos da banda de música e de banda marcial. Depois, a Bandeira era arriada ao som do Hino Nacional e Luiz Soares proferia palestra sobre tema de Moral e Civismo.
Mas, não foi somente o bairro do Alecrim que absorveu as atividades do grande educador. Em 1927, ele reorganizou, com outra denominação, a Liga de Desportos Terrestres do Rio Grande do Norte, tendo sido eleito presidente da nova entidade. Esse trabalho profícuo levou o Presidente Juvenal Lamartine, seu parente e amigo, a construir, em 1929, no Tirol, o Estádio que conserva o nome daquele chefe de governo. No mesmo ano, conferiu a Luiz Soares, no Dia do Professor, a medalha de Honra ao Mérito. Houve elementos frustrados na vida que chegaram a apontá-lo como “amigo de todos os governos”.
Mas, na verdade, Luiz Soares nada pedia para si, não era político, viveu e morreu pobre. Explicava apenas, naquele tempo, que nenhum empreendimento educacional, num meio pobre, poderia esperar completo êxito sem a decisiva cooperação dos governos. Esse desprendimento pessoal e a probidade do dedicado mestre mereceram, igualmente, reconhecimento e admiração dos revolucionários de 1930.
Vitorioso o movimento em todo o país, da Paraíba quiseram indicá-lo para o magistério federal, a fim de dirigir a Escola de Aprendizes Artífices de Natal (hoje Liceu Industrial). Não obstante as grandes vantagens pecuniárias, em relação aos parcos vencimentos do magistério estadual, recusou delicadamente a honrosa lembrança para pedir apenas que o deixassem prosseguir em sua obra no Alecrim.
Vinte anos depois, na esperança de obter maiores benefícios para a coletividade e a fim de atender a insistentes apelos de alguns ex-alunos, concordou em disputar eleição para Vereador. Seus pares, em expressiva homenagem, o elevaram à Presidência da Câmara Municipal. A experiência, porém, não o satisfez. Deixou de concorrer a cargo político.
Luiz Soares foi um dos fundadores da Associação dos Professores e pertenceu ao Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, à Academia Potiguar de Letras e ao Conselho Estadual de Educação e Cultura. Cooperou no Instituto de Proteção e Assistência à Infância e em outras entidades educativas, sociais e esportivas. Partiu dele a criação das Faculdades de Odontologia, Farmácia e Direito, havendo participado das atividades destinadas à instalação e funcionamento dessas escolas superiores. Um cidadão verdadeiramente útil à coletividade natalense.
Em sua incansável operosidade, viajou em 1950 até Roma, a convite de seu filho Pedro Segundo, procurando localizar e movimentar, no Vaticano, o processo de beatificação do padre João Maria Cavalcanti de Brito, o apóstolo da Caridade, o inesquecível vigário da Catedral de Natal.
Cuidou da assistência médico-hospitalar à população, conseguindo construir a Policlínica do Alecrim, hoje Hospital Professor Luiz Soares. Recebeu também seu nome o velho Grupo, de que foi o único Diretor e que passou a funcionar dentro do Instituto Padre Miguelinho. Uma rua do Alecrim lembra igualmente, aos habitantes de Natal o nome do professor emérito. Não se poderia aqui enumerar tudo quanto ele, através de decênios, realizou no Grupo Escolar e no Escotismo. Basta se recordar, nestas linhas, que seus escoteiros se iniciaram precisando, por força das circunstâncias, prestar assistência a muitos desvalidos, durante situações calamitosas.
Primeiro, em 1918, na terrível epidemia conhecida por “ influenza espanhola” , num Posto de Emergência, no próprio estabelecimento de ensino, para distribuição de remédios e alimentos até a domicílio. Em seguida, no atendimento a flagelados da seca de 1919, os quais tiveram de ser abrigados, pelo governo, em galpões de palha, de más condições higiênicas, improvisados em terreno baldio no Barro Vermelho. Deus protegeu, porém, a saúde daqueles jovens.
Teve Luiz Soares, nos últimos tempos, a felicidade de receber a maior (e, por isso, muito rara) das condecorações a um Chefe-Escoteiro: A Comenda do Tapir de Prata, que o General Sir Robert Baden Powell — o criador do Escotismo — reservou àqueles que, em qualquer parte do mundo, houvessem prestado, durante longos anos, com abnegação e patriotismo, inestimáveis serviços à instituição. Nunca poderão ser esquecidos os que fizeram da educação da infância e da juventude verdadeiro apostolado.
Autor: Gutenberg Costa
Fontes: Tok de História, RN Blog Prog, Guia de Turismo Blog e IBGE.
3 comentários:
Morei no alecrim quando criança saudades
Um brilhante e importante documentário sobre o bairro do Alecrim, que com certeza se incorpora à história de nossa cidade com relíquias de informações, que vão ajudar toda população natalense, conhecer com mais propriedade, o lugar onde vive. Parabéns, Gutemberg. Mário Sérgio Bulhões Sá Leitão.
Li toda história e gostei m
ito. Morei no bairro Alecrim, na Avenida 10, antiga Paianazes e depois Leonel Leite, no número 1430, onde hoje (2024) é uma loja de tecidos, CASA NOVA.
Conhecer a nossa história é muito salutar e devemos isso à pessoas de boa memória, que a podem contá-la. Uma pena que a narrativa se situa em época tão distante, do início do Bairro. Gostaria de saber mais sobre o mesmo, nas décadas de 1950 a 1980.
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